Dia desses, uma professora me dizia:
·
“Edu,
a ‘coisa tá feia’, não se compreende mais as crianças, os adolescentes. As
famílias hoje são ‘arranjos’ muito complicados, elas pouco convivem, na
verdade, pais e mães trabalham, maioria das famílias são de pais separados, e
juntados, e muitas famílias são basicamente mantidas pelas mães, pelas
mulheres. Daí não é coincidência tantos problemas, que essas crianças e
adolescentes levam para a escola, pois na verdade não têm, têm ‘arranjos
familiares’...”
Mais ou menos ligado ao tema, leiamos o
artigo a seguir:
(Eduardo Hirata)
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O que é multiparentalidade?
(Agência Matraca de Notícias da
Infância, São Luís, 29/09/2017)
A multiparentalidade
é a existência de dois ou mais vínculos de parentalidade, uma prática comum e
que tem amparo jurídico. A discussão inclui a reflexão sobre paternidade ser um
laço afetivo ou biológico, além disso, é fácil encontrar as diferentes configurações
de família, o que torna necessário regulamentar que uma criança tenha o
reconhecimento do vínculo com mais de uma pessoa. Quando isso acontece, uma
série de questões vêm atreladas, por exemplo, o relacionamento com os demais
membros da família e a responsabilidade jurídica pela criança. Para explicar
melhor essas dúvidas, convidamos a Doutoranda e Mestra em Direito pela PUCRS,
Mediadora de Conflitos e Advogada Ísis Bastos. Leia a entrevista:
Agência Matraca: O
que é a multiparentalidade?
Ísis Bastos: É a
possibilidade de uma pessoa ter mais de um pai ou mãe simultaneamente,
produzindo efeitos jurídicos em relação a todos eles a um só tempo. (FARIAS E
ROSENVALD, 2015, p. 598). A tese da multiparentalidade não é novidade no
cenário jurídico. Muitos Tribunais de Justiça já a reconheciam bem antes do
julgamento da repercussão geral 622 (decisão do Supremo Tribunal Federal que
fala sobre a prevalência da paternidade socioafetiva em detrimento da
paternidade biológica).
Agência Matraca: Quais os benefícios para a criança que têm o genitor
biológico e o afetivo?
Ísis: É muito
complexo e difícil analisar benefícios ou malefícios em abstrato, cada caso é
um caso. O conhecimento da origem genética é um direito reconhecido pelo
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). A parentalidade socioafetiva cria
vínculos de afeto e solidariedade. Caso a parentalidade genética ou biológica
seja reconhecida, é possível a inclusão de uma ou outra paternidade no registro
de nascimento.
Agência Matraca: Isso se estende para os demais membros da família, como
avós, tios ou outros?
Ísis: A multiparentalidade
refere-se à parentalidade, logo, a convivência com a família extensa ou
ampliada pode ser um dos efeitos dessa multiparentalidade, conforme diz o
artigo 25 do ECA:
Art. 25. Entende-se por família natural a comunidade formada
pelos pais ou qualquer deles e seus descendentes.
Parágrafo único. Entende-se por família extensa ou
ampliada aquela que se estende para além da unidade pais e filhos ou da unidade
do casal, formada por parentes próximos com os quais a criança ou adolescente
convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade.
Agência Matraca: Existe alguma diferença entre as responsabilidades dos
genitores biológicos e dos afetivos?
Ísis: Desde que
reconhecida, registrada e efetivada a multiparentalidade passa a ter os mesmos
efeitos reflexos da parentalidade. O que muda é o fato de serem múltiplos pais
ou mães. Seguem-se as normas materiais da Constituição Federal, do Estatuto da
Criança e do Adolescente e do Código Civil.
Agência Matraca: Como são feitos esses acordos entre as famílias?
Ísis: Atualmente um
dos caminhos mais benéficos no que se refere à proteção de crianças e
adolescentes é a mediação de conflitos. A judicialização (Processo Judicial)
pode ser necessária em alguns casos, mas se for possível, a construção conjunta
e dialogada entre os múltiplos pais/mães de um entendimento pacífico e pautado
no melhor interesse da criança ou adolescente é o caminho mais saudável e
seguro para a construção desses vínculos de afeto e solidariedade.
Entrevista: Vilma Santos
Foto: Reprodução
(http://www.rodrigodacunha.adv.br/mato-grosso-crianca-tera-o-nome-de-dois-pais-em-registro-multiparentalidade/)