·
Não estamos nem aí pros problemas sociais
brasileiros, jogando toda a culpa e responsabilidade prá cima da Dilma, do
Lula, do PT! Quanta hipocrisia! Em Açailândia do Maranhão, damos mais ênfase “ibope”
à alienação e desvios da grande i,prensa, tipo teve aberta e revistinha veja,
com o caso da jovem lutadora que imobilizou o “bandido”...
·
E de verdade, marionetad@s e manipulad@s por
essa “grande mídia”, choramos pelas Crianças e refugiad@s, sembuscarmos as
causas desste bárbaro êxodo...
(Eduardo
Hirata)
**************************************************************************
(No “DCM/Diário
do Centro do Mundo, 08/09/2015)
O grande acontecimento na internet nesta
semana não foi uma modelo que foi traída ou uma subcelebridade que resolveu
escrever uma autobiografia ou uma atriz que mostrou os seios na televisão. Foi
a foto chocante de uma criança síria morta na tentativa de fugir da guerra e da
fome e alcançar o primeiro mundo.
A família do menino Aylan Kurdi tentava
entrar no Canadá, que teria negado pedido de refúgio e ofereceu asilo ao pai da
criança depois que a foto viralizou na internet. Só depois que a tragédia foi
assistida pelo mundo inteiro – antes disso, a questão imigratória simplesmente
não era um problema da Europa (e nem nosso, para sermos sinceros).
A fotografia – que promete ser um divisor de
águas na atitude européia com a questão dos imigrantes (embora eu,
particularmente, não guarde essa esperança) — rendeu opiniões emocionadas,
ilustrações tocantes e milhões de manifestações de condolências na internet.
Parece que o mundo enxergou que a questão
imigratória – assim como várias outras questões sociais – é, sim, um problema
nosso.
O poder da internet de viralizar absolutamente
tudo finalmente alcançou um refugiado, um esquecido, um marginalizado, um
invisível. É claro que é louvável saber que as pessoas – a internet, sobretudo
– ainda são capazes de se deixarem tocar, mas isso me pareceu cruelmente raso e
efêmero, exatamente como aquelas fotos de crianças africanas famintas nas
timelines de quem diz que menino de rua é trombadinha e é a favor da redução da
maioridade penal.
A foto viralizou exatamente como a Andressa
Urach, a traição do Marcelo Adnet, a morte de um cantor sertanejo: nada muito
frutífero, nada realmente tocante, nada que vista um sentimento permanente.
Esse texto é pra você que acha que o mundo
vai mal porque um imigrante sírio foi fotografado morto numa praia, mas ignora
a guerra urbana nas favelas da sua cidade. Que lamenta a questão imigratória na
segurança do seu quarto, protegido pelos muros – visíveis e invisíveis – do seu
condomínio, que acha tocante que a tentativa imigratória mate crianças (e
adultos, e idosos), mas não enxerga que isso é um fruto amargo do mesmo sistema
que não ampara o homem que te pede esmola na mesa de um bar.
Pra você que lamenta a fome na África, o
trabalho escravo, a desigualdade social e a questão imigratória mas compra
roupas no AliExpress. Pra você que se deixa tocar pela foto de uma criança
morta – vítima da mesma, mesmíssima desigualdade que dizima o seu país, o seu
bairro, a sua rua – mas é contra programas sociais.
Esse texto é para a nossa hipocrisia que, de
tão cega, não nos deixa enxergar que nem o menino sírio, nem o garoto negro do
sinal, nem as crianças mortas na rocinha são um fato isolado, e que tudo isso
é, sim, um problema nosso. Esse texto é pra nós, que só tiramos os olhos de
nosso próprio umbigo quando vemos a foto de uma criança morta com a cara na areia.
Pra nós que somos insensíveis às mazelas da vida até que elas pisem na nossa
consciência.
Abraço!
*********************************************************
(Na foto do DCM, menino
refugiado haitiano, sem água, no Acre...)
*********************************************************