Por:
Alejandra
Meraz Velasco*, no “Portal da ANDI, 25/04/2016)
Pesquisas
em diversos campos confirmam que a
primeira infância é uma etapa fundamental para o desenvolvimento do
potencial das pessoas, conforme estabelecido na Convenção sobre os Direitos da Criança de 1989, da qual o Brasil é
signatário. Há vasta bibliografia em diferentes áreas do conhecimento que
mostram que os indivíduos aprendem
com seu entorno desde o primeiro dia de vida – e por isso é
fundamental garantir a infraestrutura adequada para uma educação atenta à
qualidade das interações entre adultos e crianças, de tal forma que as
oportunidades de aprendizagem estejam sempre presentes, e não apenas na escola.
As neurociências mostram que o
desenvolvimento do cérebro alcança sua maior velocidade nessa fase.
A economia mostra que a primeira infância é um investimento com um retorno de
até US$17 por dólar investido. É indiscutível que a aprendizagem na primeira
infância determina o futuro dos
indivíduos, e não apenas em termos de desempenho escolar ao longo da
vida, mas também em uma série de indicadores de bem-estar e redução de
envolvimento em atividades de risco – como criminalidade e uso de drogas.
No
entanto, a brecha entre as
crianças mais e menos vulneráveis se abre muito cedo, tanto na
escola quanto em casa. Enquanto 51%
da população de 0 a 3 anos das famílias no quartil mais alto de
renda frequentam a escola, apenas
22% das crianças das famílias no quartil mais baixo têm acesso à
educação. E em casa o acesso a oportunidades de aprendizagem também se
distribui de forma desigual: aos 4
anos, as crianças mais pobres terão escutado até 30 milhões de palavras a menos do
que as que se encontram em situação menos vulnerável. As pesquisas mostram que
o papel das famílias na educação e as suas expectativas em relação aos
benefícios que ela proporciona são
determinantes na trajetória escolar dos filhos – e, novamente, essa
expectativa costuma ser maior entre as famílias com maior nível socioeconômico.
Torna-se evidente que o desenho das políticas públicas deverá prever ações que
envolvam as famílias e elevem a educação na primeira infância ao mais alto
nível de prioridade na sociedade.
As
políticas para o desenvolvimento
infantil são um importante motor para a promoção da equidade, especialmente diante da constatação de que
a população infantil está desproporcionalmente representada na pobreza. No
Brasil, onde a situação é particularmente alarmante, para cada pessoa maior de 65 anos vivendo na
pobreza, há cerca de 7 crianças e jovens nessa situação, segundo estudo
promovido pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal).
Com
o objetivo de elaborar uma agenda da América Latina para o Desenvolvimento na
Primeira Infância, por iniciativa do Todos
Pela Educação, do Diálogo Interamericano e da Fundação Maria Cecília
Souto Vidigal, um grupo de gestores públicos, especialistas e membros de
organizações da sociedade civil de onze países se reuniu no Brasil para
elaborar um diagnóstico das políticas públicas e apontar caminhos para garantir
os direitos e o desenvolvimento na primeira infância.
O
diagnóstico mostra que nos últimos quinze anos houve importantes conquistas na
região: alguns países apresentaram avanços pontuais nos programas de
atendimento à primeira infância, porém ainda sem a necessária integração das
políticas públicas; outros normativamente já apontam para essa integração; e
por último estão os que conseguiram integrar na prática as políticas públicas
de atendimento à primeira infância, como é o caso deChile, Colômbia, Cuba e Equador. O Brasil, embora aponte para
a integração das políticas públicas no programa Brasil Carinhoso, não executa de forma articulada as políticas
para a primeira infância que são responsabilidade da assistência e do desenvolvimento
social, da saúde e da educação, por exemplo, nas três esferas de governo. Isto
é, a articulação da escola com o
posto de saúde depende da iniciativa e da capacidade de articulação local dos
gestores escolares, pois não há nenhum registro do desenvolvimento da
criança compartilhado por pediatras e professores, nem se prevê a formação
necessária para que esses profissionais articulem seus saberes.
Com
esses desafios em perspectiva, a Agenda Regional para o Desenvolvimento
Integral na Primeira Infância sistematiza o que entendemos serem os cinco
principais avanços necessários para consolidar o atendimento de qualidade às crianças dessa faixa etária na América Latina:
a definição de métricas que permitam monitorar o desenvolvimento infantil e identificar as
situações de desigualdade; a criação de uma instância nacional com autoridade
orçamentária e política para realizar as articulações
necessárias entre as políticas públicas; a definição de mecanismos de
articulação das políticas no território; a
ampliação e o fortalecimento da gestão do conhecimento sobre o
tema; e o estabelecimento de uma coalizão regional visando consolidar as políticas de desenvolvimento
infantil como prioridade de todos os países.
Diante
da constatação de que a primeira infância é determinante para o desenvolvimento do indivíduo, não
podemos mais negligenciar a importância estratégica dessa agenda para garantir uma educação de qualidade para
todos e promover o desenvolvimento social e econômico do país. O desafio da
universalização da pré-escola e da ampliação do acesso à creche no Brasil abre
para o país a oportunidade de fazer avançar de forma vigorosa o desenvolvimento
infantil.
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*Alejandra
Meraz Velasco é superintendente do movimento Todos Pela Educação.
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É preciso levar mais a sério a educação pré-escolar, mas igualmente as competências e habilidades das famílias. Aqui em Açailândia do Maranhão, francamente, estamos anos-luz disso... (Eduardo Hirata)