“As comunidades
frente aos impactos da siderurgia em Açailândia e no Brasil”
Audiência
Pública na Câmara Municipal de Açailândia
(Ata, por Padre
Dario Bossi, da Paróquia Santa Luzia e da Justiça nos Trilhos)
A audiência
pública começa às 9 horas de quinta-feira 15 de agosto de 2013, à presença de
cerca cem pessoas, moradores do bairro de Piquiá de Baixo e outros bairros da
cidade, bem como de moradores da comunidade S. Cruz do Rio de Janeiro,
igualmente atingida pelos impactos da siderurgia.
Presentes também
a Paróquia S. Luzia, a rede Justiça nos Trilhos, o Conselho Municipal da
Criança e do Adolescente, do Fórum da Criança e do Adolescente
É composta a
mesa das instituições presentes à audiência pública.
A presidenta da
Câmara Municipal da Câmara, Lenilda Costa, saúda todos os presentes. Faz
referência ao sofrimento das famílias humildes do Piquiá de Baixo e à sua luta
em busca de socorro.
Diz que a Câmara
Municipal está querendo defender o direito dos moradores de Piquiá de Baixo e
convida a população a não desistir. Lenilda Costa representa na mesa também
outros vereadores presentes: vereador Canela, vereadora Fátima Camelo e
vereador prof. Pedro.
O dr. Igor
Araújo de Arruda, representando a Defensoria Pública Estadual, em seu núcleo de
Açailândia, faz referência aos impactos que estão prejudicando a comunidade de
Piquiá. Lembra da última audiência pública promovida pelo MPE sobre esse tema e
o obstáculo jurídico que está vindo complicar a efetiva transposição do bairro.
O dr. Leonardo
Rodriguez Tupinambá, do MPE de Açailândia, participa à audiência em companhia
da dra. Samira Mercês dos Santos, da Dra. Camila Gaspar, da Dra. Glauce
Malheiros e da Dra. Sandra Fagundes, promotoras públicas na comarca de Açailândia.
Introduz sua
fala fazendo referência a Ex 32, trecho da Palavra de Deus no qual Moisés e
Josué ouviram um mesmo barulho no acampamento e o interpretaram um como cantos
religiosos, outro como cantos de batalha. O primeiro, de fato, era um religioso,
o segundo um militar. O mesmo acontece no Piquiá de Baixo: há interesses
diferenciados, uns visando o lucro, outro a dignidade e a vida. Interpretações
diferentes da mesma realidade.
Alguns meses
atrás uma audiência pública na Câmara municipal apresentou o projeto
urbanístico-arquitetônico para o reassentamento do novo bairro de Piquiá de
Baixo.
È um dos poucos
casos em que a comunidade apresenta ao poder público um projeto para resolver
seus próprios problemas de moradia. Geralmente isso acontece de cima para
baixo. Mesmo assim, a Prefeitura até hoje não se pronunciou a respeito do
projeto. Só comentou-se que é um projeto carregado de sonhos. Mas todos os
sonhos precisam de concretizações.
Nossa luta é
pontuada por duas vertentes: o projeto urbanístico e o processo de
desapropriação. Em relação a esse segundo ponto, um possível acordo entre as
partes poderia resolver rapidamente a situação. Mas me parece que cada vez mais
fique difícil. Há duas semanas atrás houve uma reunião do MPE e dos representantes
da gusaria com o juiz da causa, que disse que até o final de setembro o
processo de desapropriação virá a ser julgado.
O problema vai
ser resolvido, muito menos por interesse do poder público ou das empresas e
muito mais pela ação popular. Cada dia que passa, eu me impressiono pela
organização do Piquiá de Baixo. Hoje capaz de convocar sua própria audiência
pública, em que as autoridades são simplesmente ouvintes atentos.
A mesa é
desfeita e vem sendo composta a mesa do debate.
Ir. Antônio
Soffientini , da Paróquia Santa Luzia de Piquiá, abre o debate dando as boas
vindas. Destaca que todos os convidados à audiência de hoje são unidos numa
luta comum contra os impactos da mineração e da siderurgia.
Nesses três dias
de intercâmbio, os moradores de Piquiá de Baixo e de S. Cruz, querem crescer
juntos e encontrar caminhos e soluções para seus problemas e impactos. É
importante debater isso no coração da cidade, que é a casa do povo e da
construção de uma cidade mais justa.
Ivo Soares,
pescador da baia de Sepetiba, relata os impactos sofridos pela comunidade
devido às atividades da siderúrgica TKCSA, de propriedade da empresa alemã
ThyssenKrupp e da Vale.
As obras de
dragagem para a construção do complexo siderúrgico comprometeram a pesca na
região e o acesso livre ao canal de pesca por parte dos pescadores. Quando o
vento sopra de norte para sul, o material particulado emitido pelas
siderúrgicas polui a comunidade inteira.
Andréa
Rodrigues, moradora de S. Cruz, é dona de casa. Sofre o impacto da “chuva de
prata”, que suja a casa e a roupa do varal. A comunidade sofre com problemas de
enchentes porque a empresa desviou o curso do canal com duas curvas de noventa
graus. Isso faz com que os rejeitos voltem, a comunidade se alaga e chega a
invadir por mais de um metro dentro das casas. Já perderam os móveis. Isso já
aconteceu cerca de 15 vezes. A empresa foi denunciada e condenada a uma multa
de 60 milhões. Até hoje, porém, esse dinheiro não foi pago.
Em parte o
problema dos enchentes foi resolvido, mas as multas ainda não são pagas.
Sinto-me órfã de um governo que não aparece e das empresas ausentes. Mesmo
assim, nossa luta não para. Nos sentimos dentro de uma senzala aberta, nas mãos
dos alemães da ThyssenKrupp. Martil Luther King diz que o que mais incomoda não
é o grito dos maus, mas o silêncio dos inocentes. È contra isso que temos que
lutar.
O hino de
Açailândia fala “filho dos açaizais”. Mas onde estão os açaizais de vocês?
Temos que lutar em defesa de nossos territórios.
A gente passa o
Natal dentro do esgoto, ano novo debaixo da chuva de parta, uma inteira semana
dentro de enchentes. Um bairro perto de minha comunidade é atravessado pelo
trem de minério, não coberto e poluindo, o trem passa rachando as casas. A
gente perde moradia, dignidade, esperança. Mas não queremos desistir.
Me orgulho muito
de vocês, povo de Piquiá.
Jaci do Nascimento mora “dentro
da TKCSA”. A empresa acabou com nossa
baia de Sepetiba. Hoje a gente come pó de ferro e os poucos peixes na baia são
difíceis de pescar, inclusive contaminados. Fica difícil, assim, manter nossas
famílias. E a inteira cadeia alimentar fica prejudicada. Nossa saúde está
precária. A fábrica de cimento Votorantin, dentro da TKCSA, também polui.
Muitas pessoas entre moradores e pescadores fizeram um abaixo-assinado contra a
implantação da empresa. Mas o processo de licenciamento ambiental ignorou
totalmente a existência de uma comunidade na região. E eu moro lá há 30 anos!
Mais de oito mil pescadores estão correndo perigo de desemprego e fome.
Onde a empresa
foi implantada, era para ser uma reserva ambiental, pela riqueza da fauna e da
flora. Hoje está tudo contaminado. O Conselho Municipal de Saúde de S. Cruz é
conivente com a empresa. A Marinha Militar também atua em sintonia com a
empresa e não apoiando os moradores.
Karina Kato, do
Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul – PACS, do Rio de Janeiro,
apresenta algumas fotos destacando as semelhanças entre Piquiá de Baixo e S.
Cruz. Reflete assim sobre o tipo de desenvolvimento que está sendo promovido e
em favor de quem isso se põe.
Uma área natural
linda, rica de plantas medicinais e diversidade biológica, valorizada pelo
turismo, acabou sendo ameaçada pela expansão do parque industrial do Rio de
Janeiro. A baia de Sepetiba seria o ponto de exportação do minério de ferro e
do aço, para o exterior. O minério chega de Minas Gerais, pelo trem que
atravessa as comunidades e vai sendo escoado para outros países. Projetos que
vê de fora, pensados de fora e em vista do que está fora da comunidade. Falta
totalmente a escuta dos moradores. Trata-se das áreas do rio de Janeiro com
menor IDH, onde a maioria da população é negra. As políticas públicas de
investimento são embasadas sobre injustiças e racismo ambiental. É nas áreas
mais pobres que se instalam os projetos mais impactantes. Isso une muito Piquiá
e S. Cruz.
Foi transformado
plano diretor da região para permitir a instalação das empresas. Reconhece-se
que a região proporciona grandes impactos à saúde, mas não houve nenhuma
preocupação para com os moradores já instalados nessa região. A população não
foi avisada e foi sempre ignorada. Isso também é um elemento comum entre Piquiá
e S. Cruz.
Outro ponto que
une Piquiá e S. Cruz é a Vale, protagonista dos impactos em ambas as
comunidades. A mineradora diz que não é responsável pela situação no Piquiá,
mas é única fornecedora de minério, transporta o ferro gusa das siderúrgicas,
tem com elas contratos privilegiados e pôde se instalar, através do Programa
Grande Carajás, exatamente pela promessa de instalação do polo siderúrgico.
As empresas
chegam prometendo progresso e emprego, a “civilização”. Na prática, os empregos
gerados são para pessoas de fora. Também o polo siderúrgico atraiu muitas
pessoas de
Nossos
representantes não estão representando nosso interesses, mas os do capital
privado.
Desde 2010 e até
hoje, sem licença de operação, a TKCSA está poluindo com chuva de prata.
Constantemente cai pó por cima das casas de S. Cruz. A empresa diz que trata-se
de grafite e que não faz mal. Depois de anos, reconheceu-se que a composição
química é muito mais complexa e impactante sobre a saúde.
A comunidade
critica esse tipo de desenvolvimento e construiu um Plano Popular de
Desenvolvimento de S. Cruz. Realizaram-se oficinas na comunidade, bem como pressões
internacionais e visitas à sede da ThyssenKrupp na Alemanhã.
Edvard Dantas
Cardeal, presidente da Associação Comunitária dos Moradores de Piquiá, lamenta
a ausência à audiência pública de muitos vereadores, de todos os secretários
municipais e da prefeita de Açailândia.
O prof. Messias
Pereira Júnior, da UEMA, faz referências a um estudo que realizou sobre as
canaletas de descarga de água das siderúrgicas do polo industrial de Açailândia
para o rio Piquiá.
Foi feita
medição da qualidade da água a montante e à jusante das canaletas, a uma
distância de cerca 12 metros entre os dois pontos de medição. Houve uma
diferença de 40-45 vezes mais metais pesados entre um ponto e o outro.
Toda a cadeia de
vida que se alimenta dessa água fica sendo contaminada por essas emissões.
Ainda hoje, nas
siderúrgicas, não tem bacia de sedimentação, nem tratamento de água de emissão.
Não há avaliação de partículas sutis emitidas no ar.
Uma outra
pesquisa feita pela UEMA, com o químico dr. Diniz, demonstrou grande quantidade
de enxofre e sulfatos na água e na região.
Na região de
Açailândia não existe um comitê de bacias formado, nem dados sistematizados que
possam servir para comparações. À época da implantação das siderúrgicas não
havia normas suficientes para um efetivo licenciamento ambiental de qualidade.
Não entendo
porque, hoje, são renovadas as licenças de operação sem regulares estudos de
impactos ambientais, mesmo sabendo de todos esses impactos.
Entrando na área
da siderúrgica Gusa Nordeste, vê-se placas que fazem referência a uma “área de
preservação ambiental”. Só há três metros de mata e emissões de água poluída,
mas as placas declaram que há preservação.
Queremos
avaliação de impactos ambientais, não só para Piquiá mas para o município por
inteiro. Veja-se como outro exemplo grave a situação do matadouro, que lança
sangue de 60 animais por dia, sal e todos os descartes diariamente livres no
meio ambiente. Haverá um custo absurdo de recuperação ambiental dessa área.
Acredito que
haverá reassentamento do Piquiá de Baixo, mas a luta deve ser muito maior,
garantindo respeito ao meio ambiente inteiro na região.
Mariana de La
Fuente, pesquisadora e militante do Centro de Defesa da Vida e dos Direitos
Humanos Carmen Bascaran de Açailândia, destaca que em relação à população há
invisibilização e os próprios moradores são culpados. Lamenta a ausência de
estudos prévios em Açailândia, para poder realizar comparações.
As emissões de
poluente acabam caindo dentro dos corpos de água em volta da comunidade.
Mariana estudou
o índice biológico da qualidade da água da Lagoa do Quarenta, no Piquiá de
Baixo. Não encontrou, em suas análises, micro-organismos que sinalizem a pureza
da água, mas somente os mais resistentes à poluição. Significa que o
ecossistema de Piquiá de Baixo está sendo sufocado pela poluição e a base da
cadeia alimentar está sendo prejudicado. É a ponta de uma grande violação, que
depois se percebe de forma mais evidente pela poeira e a poluição.
Marcelo Firpo é
pesquisador do Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana, da
Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), no Rio de Janeiro. Reflete sobre o modelo de
economia internacional: a partir dos anos ’80, a chamada “fase quente” da
siderurgia sai dos países mais ricos e se desloca para os países periféricos
(China, índia, Coreia do Sul, México, Brasil). Em Açailândia aconteceu bem
antes do que outros locais, como com a TKCSA, Açailândia faz parte de um
processo estratégico industrial de reaproveitamento da sucata dos EUA. Um país
que consome muito e precisa reaproveitar de seus descartes.
Para esse
reaproveitamento, precisa do ferro-gusa (primeira etapa de elaboração do
minério). Por isso foi tão importante (e tão fácil) instalar, com pouco
controle ambiental, as siderúrgicas no Piquiá. Essa é uma regra injusta do
comércio internacional. Onde há menos democracia, menos cuidado ambiental e
menos respeito para o cidadão, os investimentos são maiores e os moradores
pagam mais impactos.
Projetos
violentamente intensivos em energias e recursos naturais, geram injustiças
ambientais. Faltam direitos, violentados pelos grandes empreendimentos.
Parabenizo a
Justiça nos Trilhos e a população de Piquiá de Baixo, bem como de S. Cruz, pois
é a luta deles que dá visibilidade e sentido, transformando a injustiça no
conflito e numa possível reversão de processos. Como é importante também a
presença das instituições, que muitas vezes ficam ao reboque desse modelo de
desenvolvimento.
A TKCSA tem uma
forte relação com o Maranhão, pois foi o movimento “Reage São Luís” que
expulsou esse projeto que queria se instalar, junto a outras duas outras
grandes siderúrgicas, na ilha de São Luís. Um desses investimentos, o da TK,
foi convidado pelo governador do estado do rio de Janeiro para se instalar na
capital do estado, com subsídios e facilitações, em nome do desenvolvimento.
Portanto, o
Maranhão, um dos estados mais pobres e injustos do País, foi ensinando
resistência a outros estados.
Como é
importante se unir para outro modelo de desenvolvimento. Se não, simplesmente,
os empreendimentos encontrarão sempre algum lugar onde facilmente se instalar.
O ciclo de
siderurgia trabalha com metais pesados. Na TKCSA se trabalha com carvão mineral,
que é muito mais poluente do que o vegetal. Em compensação, porém, as poeiras e
os metais pesados, além dos acidentes, continuam existindo.
Temos portanto
três impactos:
- ao
ecossistema: desmatamento ilegal, as
chamadas “florestas plantadas” de eucalipto denunciadas pelos ambientalistas
como “desertos verdes”
- impactos à
saúde dos trabalhadores: já tive conhecimento de acidentes mortais no Piquiá
- impactos à
saúde ambiental da região inteira. Há situações de exposição pelas quais a
pessoa que mora fora da fábrica é como se estivesse dentro da fábrica!
O material
particulado sempre é problemático. A poeira gera problemas oftalmológico,
dermatológico, e no caso do PM10 e PM 2,5 é particulado que entra no pulmão e
carrega metais pesados muito perigosos, como cromo, manganês e cádmio. As
normas brasileiras são muito fracas nisso. Há também produção de sustâncias
químicas orgânicas (como dioxina e HPAs) extremamente perigosas, presentes
sobretudo no caso de queima de carvão mineral.
Qual o papel da
Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz)? Tem missão de apoio ao sistema público de
saúde, vigilância à saúde pública e dos trabalhadores. É apoiada ao Ministério
da Saúde, mas tem conseguido uma certa independência. Trabalha junto à Rede
Brasileira de Justiça Ambiental e às comunidades impactadas. Há muito poucos
pesquisadores que se dispõem a estudar impactos gerados pelas grandes empresas.
São urgentes contra-pareceres, que deem base científica para as denúncias da
população. É absolutamente óbvio que não podem existir escolas públicas e casas
ao lado das empresas; esses estudos podem ajudar na luta e nas reivindicações
dos moradores.
As empresas
também tendem a financiar pesquisadores que defendam o lado delas e justifiquem
o fato que os impactos delas não são tão violentos. Por isso é importante ter
pesquisadores independentes. Eu e outros colegas estamos sendo processados
pelas empresas pelo fato de ter realizado, no Rio de Janeiro, esses relatórios
e contra-pareceres avaliando as falhas e injustiças no processo de
licenciamento desses empreendimentos.
O caso da TKCSA
é o único no Brasil em que uma licença de instalação e pré-operação está
demorando tanto, sem conseguir a licença de operação definitiva. Mas não temos
força política suficiente, lá, para forçar a interrupção das operações tão
poluidoras.
Estou começando
a me envolver diretamente em Piquiá, em parceria com a Justiça nos Trilhos, e
nós da Fiocruz temos interesse para que a resistência dos moradores seja
amparada também por nossa pesquisa.
É muito importante
ampliar nossas lutas e fazer do caso de Piquiá um emblema de lutas por justiça
ambiental no Brasil.
Cristiane
Faustino, relatora do Direito Humano ao Meio Ambiente da Plataforma DHESCA
(mandato 2012-2014), descreve brevemente o papel dessa Plataforma no
monitoramento das violações de direitos humanos no Brasil. A Plataforma DHESCA
é uma iniciativa da sociedade civil brasileira que, desde 2002, tem como objetivo
contribuir para que o Brasil adote um padrão de respeito aos Direitos Humanos,
Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais.
Cristiane
lamenta, em sua fala, a ausência de várias autoridades públicas na audiência.
Apresenta-se como pessoa que, em função de sua missão na Plataforma DHESCA e de
seu histórico de militância, tem visitado muitas comunidades e territórios
impactados; relata que o caso de Piquiá de Baixo
Não se pode
subordinar os direitos humanos a questões burocráticas ou à falta de pesquisas
científicas. É um impacto tão gritante, que a falta de resolução do mesmo é
falta de compromisso ético com a vida.
Apresenta a
missão Carajás da Plataforma DHESCA, realizada no mês de março visitando
numerosas comunidades ao longo do corredor de Carajás, de Parauapebas (PA) até
São Luís (MA). A missão foi realizada com o apoio da rede Justiça nos Trilhos e
de vários movimentos, organizações sociais e de pesquisa da região.
Refere que o
relatório final da missão será pronto no mês de setembro e será apresentado
oficialmente ao público no Maranhão, no Pará e em Brasília.
Apresenta o
contexto da mineração e da duplicação do sistema norte da Vale, com seus
impactos na inteira região. A mina S11D, a duplicação da Estrada de Ferro
Carajás e a expansão do porto de Ponta da Madeira.
Trata-se de um
projeto enorme, que prevê investimento de mais de 19 bilhões de dólares. A exploração
de ferro vai passar de pouco mais de 100 milhões de toneladas por ano até 230
milhões de toneladas por ano.
A Vale detém um
direito real de uso de mais de 400mil hectares na área de Floresta Nacional de
Carajás. Trata-se de uma Unidade de Conservação e a Vale tem a responsabilidade
de gerenciar a floresta, com a possibilidade de exploração das jazidas de ferro
ali presentes.
Além disso, a empresa ocupa o território do
entorno da Estrada de Ferro Carajás, em sua área de influência direta e indireta,
bem como as regiões ao redor do porto de São Luís.
Há uma ocupação
física, econômica e também ideológica dessa grande empresa na região de
Carajás, a qual precisa ser analisada e compreendida também a partir dessa
influência.
Uma série de
impactos diretos expressam bem essa influência da empresa na região: acidentes
com mortes por atropelamento de trem, poluição sonora, violações ao direito de
ir e vir, vigilância e perseguição às lideranças locais, etc. A mineração traz
impactos sobre a vida das mulheres, é mais um exemplo de injustiça e racismo
ambiental.
Melisanda
Trentin é integrante da ONG de direitos humanos Justiça Global, de Rio de
Janeiro. Valoriza o intercâmbio entre Piquiá de Baixo e S. Cruz, como
oportunidade de fortalecimento recíproco.
A Justiça Global
é uma organização de defesa dos direitos humanos em nível nacional e com
atuação internacional, levando a esse nível os conflitos irresolvidos pelas
autoridades brasileiras.
A Justiça Global
desenvolve, em parceria com PACS e Justiça nos Trilhos, um projeto sobre
Direitos Humanos e Indústrias Extrativas, articulado com Peru, Colômbia,
Canadá, Moçambique, África do Sul. Esse
projeto pretende interagir com as comunidades impactadas pelo ciclo de mineração
e siderurgia no Brasil, incluindo também o Piquiá.
A Justiça Global
trabalha também na linha da defesa da Justiça Ambiental e faz parte da
Plataforma DHESCA, compartilhando seus métodos e objetivos.
Há muitos
impactos ao longo do Corredor Carajás. No Piquiá fomos muito bem recebidos,
constatamos várias violações de direitos humanos e percebemos a urgência de
viabilizar a proposta de reassentamento do Piquiá de Baixo. Quando uma
comunidade inteira se propõe de deixar seu lugar de nascimento e de vida, é
porque a situação está de fato insustentável.
Danilo Chammas é
integrante da rede Justiça nos Trilhos. Lembra que o processo de reassentamento
vem de longe, tem várias dificuldades e bloqueios, mas também conseguiu várias
vitórias e está mantendo a população de Piquiá de Baixo unida e firme em sua
luta.
Há na região um
conjunto de violações que precisa ser reparado e indenizado, pela força da lei.
Os protagonistas
dessa luta são os moradores de Piquiá de Baixo, aliados hoje aos moradores de
S. Cruz. A audiência de hoje é mais uma oportunidade de se conhecer e se
fortalecer. Cinco pessoas de Piquiá de Baixo já visitaram a comunidade de S.
Cruz no Rio de Janeiro; elas poderão facilitar a interação entre os dois
grupos. Essa lógica de intercâmbio é muito útil; hoje está acontecendo também
um intercâmbio entre pesquisadores e cientistas, rico de oportunidades.
A luta de cada
uma das duas comunidades tem inspirado muita gente. É importante fazê-las
conhecer à opinião pública de Açailândia.
O ir. Antônio
Soffientini encerra a audiência pública às 12.15h, parabenizando os presentes
por ter permanecido numerosos e atentos até o final e explica que o intercâmbio
entre as comunidades de Piquiá de Baixo e S. Cruz continuará por mais dois dias
inteiros.
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Brava gente do Pequiá de Baixo, gente altaneira e
resiliente, consciente de seus Direitos e e sua Cidadania; brava gente de Santa
Cruz-RJ; brava gente da Paróquia Santa Luzia, da Justiça nos Trilhos, do Centro
de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos Carmen Bascaran; do Ministério Público
Estadual/Promotorias de Justiça da Comarca; da Defensoria Pública Estadual; de
tanta gente açailandense e de instituições locais, nacionais e internacionais
que apoiam a causa, desta verdadeira
guerra contra os impactos sociais e ambientes da mineração e da siderurgia, que
tanto tem e vem fazendo estrago, este famigerado “trem do progresso”, como dito
por uma palestrante.
É de eventos de
construção de cidadania assim que
Açailândia, não da demagogia e embromação que o poder executivo
municipal proporcionou, a dois dias passados, na mesma “casa do povo”...
Parabens a todos
e a todas que combatem com bravura nesta grande guerra!
(Eduardo Hirata)