Hipocrisia ou repúdio imediato de
toda a violência
O artigo a seguir, do
Padre Dário Bossi, nos diz tudo em relação à violência que assola o Maranhão e
nossa Açailândia. Que este domingo das luzes, e com a iniciativa dos Bispos
maranhenses, seja um passo decidido e decisivo na prevenção e no combate a essa
violência, à injustiça e à impunidade. (Eduardo Hirata)
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Hipocrisia ou repúdio imediato de
toda a violência
(Pe. Dário Bossi,
Missionário Comboniano, 02/02/ 2014)
Nessa noite o Maranhão iluminou-se.
Centenas e centenas de comunidades
cristãs, no Estado inteiro, caminharam em silêncio pelas ruas das periferias
urbanas ou pelas veredas dos povoados rurais, cada pessoa com uma vela na mão.
Foi uma resposta de fé ao apelo dos
bispos do Maranhão contra a violência em Pedrinhas, em todas as cadeias, nas
periferias onde o tráfico de drogas tomou controle do território, nas terras
indígenas e quilombolas...
Nessa mesma semana, porém, em
Açailândia carregaram-se nuvens sombrias.
Quarta-feira passada, conforme
relatos de testemunhas, “um grupo de cerca de 30 a 50 mototaxistas armados com facões, facas e revolveres
invadiram, após chutarem a porta de uma residência em uma rua erma, no
Residencial Tropical, onde se encontravam três pessoas, que foram imediatamente
torturadas com fios de energia e cordas. (...) Valdimar de Araújo Bezerra, 30
anos, foi amarrado e levado na garupa de um dos mototaxista. (...) Era suspeito
de ter participado da morte de um mototaxista de Açailândia, Charles Alves
Santos, 27 anos, que foi morto com mais de 20 facadas” (conforme o blog Rei dos
Bastidores e o jornal O Progresso).
A imprensa, como sempre, noticia
esses dramas apresentando imagens sangrentas dos corpos assassinatos, em total
desrespeito às vítimas e seus familiares e –de certa forma- proporcionando mais
um incentivo à violência. Com o evidente objetivo de “vender” mais, alimenta-se
o gosto do sangue e a banalização da vida. Algumas famílias corajosas, que se
sentiram lesadas por essas atitudes da mídia, já processaram um jornal de
Açailândia. “Fotos de cadáveres, chocantes, decorrentes de mortes brutais, sem
qualquer conteúdo jornalístico, gerando afronta ao princípio da dignidade da
pessoa humana e o direito de imagem que resguarda a memória dos mortos”,
comentou o juiz Antonio dos Santos Machado em sentença preliminar.
O que une a caminhada nãoviolenta
organizada pelos bispos do Maranhão às atrocidades repetidas nessas semanas por
moradores de Açailândia não é simplesmente um estado de violência, mas uma
verdadeira Violência de Estado.
A omissão, a morosidade ou a total
inconsistência do sistema de justiça e de segurança do Estado reforça na
população uma sensação de abandono, falta de proteção e ausência de autoridade.
Juntando a isso a fragilidade do
sistema de garantias de direitos, a precariedade das condições de vida de uma
boa fatia de maranhenses e a péssima situação do sistema público estadual e
municipal de educação e serviços sociais, temos todos os ingredientes para a
receita da violência institucionalizada.
Esse é o caldo em que, com uma certa
facilidade, as pessoas que se sentem provocadas e abandonadas a si mesmas
transformam-se em animais descontrolados, sedentos de vingança, querendo
justiça somente para si e por si.
Dá para entender uma violência
coletiva tão irracional. Mas não para justificá-la.
Dentro de nós temos uma consciência!
Somos seres humanos, esquecemo-nos de nossa humanidade?
É urgente que cada pessoa tome uma
atitude corajosa e radical e repudie a violência e a vingança.
Precisamos começar pelas atitudes
cotidianas:
- boicotar filmes ou videojogos
violentos, que incentivam a morte, as armas e o combate e chamam de herói quem
elimina as pessoas indesejadas. Como podemos permitir que nossos filhos bebam
de graça essa cultura de sangue?!
- não banalizar a violência nos
discursos de cada dia, ter a coragem de repudiar publicamente gestos como esse
ou outros linchamentos, não brincar com a dor ou a morte de outras pessoas, não
valorizar gestos de vingança;
- educar nossos filhos ao respeito
dos mais fracos, ao diálogo e à defesa intransigente da vida;
- assumir nossa fé cristã ao afirmar
que repudiamos a pena de morte, as condições desumanas das cadeias, a redução
da maior idade penal.
Essa vela que as igrejas carregaram
na noite de domingo não seja hipócrita ou símbolo de uma fé que transfere as
responsabilidades para Deus ou adia a paz à vida eterna...
É urgente incendiar nossas
consciências com indignação, comprometer-nos pela vida, expulsar o demônio da
violência de nossa sociedade.
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