Transformar os jovens
infratores em bodes expiatórios não vai resolver o problema da segurança no
Brasil
(Por Miguel Martins
— publicado em “Carta Capital”-SP, 22/08/2014)
(Foto de Marcos Santos
/ USP Imagens : Jovens da Fundação Casa. Sistema pune muito, mas pune mal, diz
analista)
A julgar pelas pesquisas de opinião,
o Brasil é um país majoritariamente conservador. Em 2013, o instituto Datafolha
aferiu que 48% dos brasileiros julgavam-se de direita ou de centro-direita,
ante 30% da população que se identificava com pautas progressistas. Tal
distância entre os espectros reflete em parte a opinião dos cidadãos com
relação a alguns temas. O casamento gay é rechaçado por 49,7% da população,
segundo pesquisa da Confederação Nacional dos Transportes. São contrários ao
aborto 71% dos brasileiros, de acordo com o Datafolha. Três quartos dos
brasileiros, de acordo com a Universidade Federal de São Paulo, dizem ser
contra a legalização da maconha. Essa tendência conservadora acentua-se de
forma descomunal quando o tema é a proposta de redução da maioridade penal para
16 anos, aprovada por 89% da população, segundo pesquisa realizada por Vox
Populi e CartaCapital no ano passado.
Embora criticada por juristas e
especialistas em políticas públicas voltadas à criança e ao adolescente, a
proposta tem ganhado fôlego no Congresso. Criada em 2011, a Frente Parlamentar
pela Redução da Maioridade Penal conta com o apoio de mais de 200 deputados. A
Proposta de Emenda Constitucional que defende o novo limite, de autoria do
senador tucano Aloysio Nunes, candidato a vice-presidente de Aécio Neves, deve
ir a plenário ainda este ano. Na outra ponta, o PT, tradicionalmente contrário
à mudança, cede à tentação de agradar à parcela conservadora da sociedade, por
cálculos eleitorais ou para tentar diminuir o estrago que a medida poderia
causar. Como opção à PEC de Nunes, um grupo encabeçado pelos parlamentares
Humberto Costa e Eduardo Suplicy, com participação da ministra dos Direitos
Humanos, Ideli Salvatti, estuda apresentar um projeto que aumenta o tempo de
pena para jovens infratores reincidentes em crimes graves, entre eles homicídio,
latrocínio e estupro.
Ambas as propostas parecem ignorar a
exaustão do sistema carcerário brasileiro, que convive com superlotação nas
prisões comuns e nos centros de atendimento socioeducativo. A redução da
maioridade penal poderia inflar ainda mais a população carcerária, atualmente
superior a 550 mil presos, responsável por posicionar o Brasil entre os quatro
países com maior número de presos no mundo. A situação poderia ser pior.
Segundo um levantamento do Conselho Nacional de Justiça de 2012, há mais de 500
mil mandados de prisão não cumpridos, o que poderia dobrar a população
carcerária brasileira. Na outra ponta, a proposta do PT esbarra na falta de
espaço nos centros destinados à criança e ao adolescente. Em São Paulo, 90% das
unidades da Fundação Casa apresentam superlotação.
Para Pedro Serrano, professor de
Direito Constitucional da PUC, o Brasil atravessa um momento em que o clima
político, cultural e midiático estimula o “punitivismo”: as soluções escolhidas
para enfrentar a violência passam sempre pelo endurecimento das penas.
“Acredita-se que há impunidade no Brasil, mas não é verdade. Punimos muito, mas
punimos mal.” Segundo o jurista, as condições insalubres dentro das prisões
impedem o maior controle por parte do Estado. “Isso estimula o surgimento do
crime organizado. Ao se colocar na cadeia um usuário de drogas como se fosse um
traficante, ele pode se tornar mais à frente um homicida.” Serrano menciona o
caso dos Estados Unidos, onde se estima que 250 mil jovens são processados,
sentenciados ou encarcerados como adultos todo ano. Em 17 estados, não há idade
mínima para um jovem ser julgado na Justiça Comum. Apesar de as taxas de
criminalidade terem caído no País desde os anos 1990, um estudo do Centro de
Controle de Doenças e Prevenção (CDC) estimou que jovens presos ao lado de
adultos têm 34% mais chance de voltar a cometer crimes.
Fabio Paes, representante da ONG
Aldeias Infantis e integrante do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do
Adolescente, afirma que a formulação das perguntas sobre o tema nas pesquisas
de opinião pode levar a distorções. “Quando o enunciado consiste entre ser a
favor ou contra uma pauta que envolve punição, o cidadão tende a se posicionar
favoravelmente.” Essa postura talvez ajude a explicar as diferenças entre os
levantamentos realizados recentemente por Vox Populi e Datafolha. Enquanto o
primeiro questionou se o cidadão concordava ou não com a redução, o segundo
perguntou se os adolescentes que cometem crimes devem ser punidos como adultos
ou precisam ser reeducados. Segundo o Datafolha, 74% defenderam a primeira
opção. Uma proporção bem mais próxima daqueles que se opõem à legalização da
maconha e do aborto.
Paes afirma que a adesão à proposta é
motivada pelo desconhecimento da população das políticas públicas desenvolvidas
pelo Ministério do Desenvolvimento Social e pela Secretaria de Direitos
Humanos. O Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo, programa da SDH
criado em 2012, busca garantir nacionalmente o cumprimento de modalidades
previstas na legislação da criança e do adolescente que escapem à mera
aplicação da punição. Há oito medidas que deveriam complementar a internação,
entre elas a inclusão em programas comunitários, o tratamento médico,
psicológico ou psiquiátrico e a participação dos jovens em programas para
alcoólatras e dependentes químicos.
Embora ofereça recursos e assistência
metodológica, o Sinase foi adotado por poucos estados, constata Paes. Muitos
deles nem sequer entraram com um projeto para captar a verba. Não por menos,
0,1% dos jovens em regime de restrição e privação de liberdade cumpre medidas
socio-educativas no País, segundo a SDH. Antes de cogitar investir em soluções
ineficazes como a redução da maioridade penal, é importante dar uma chance para
aquilo que está à disposição, mas não é aplicado.
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(De Eduardo Hirata,
pela Secretaria Executiva do Fórum DCA Açailândia – Centro de Defesa da Vida e
dos Direitos Humanos Carmen Bascarán)
E aqui em Açailândia do
Maranhão, prá maioria da população adianta sim reduzir a maioridade penal, vai
reduzir e muito, a violência e a
criminalidade... E para a maioria, se viesse “acoplada” à pena de morte, melhor
ainda: ainda acabava de vez com a bandidagem dos “menores”...
Embora as instituições
de proteção e defesa dos Direitos de Crianças e Adolescentes, a mais de um ano,
tenham assumido em Brasília, lideradas pelo CONANDA/Conselho Nacional dos
Direitos da Criança e do Adolescente , Conselho Nacional de Juventude e
Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, uma “campanha”, em
parcerias ampliadas e potencializadas com outras, contra a redução da idade penal, a “onda
pró-redução” parece um “tsunami”...
Aqui em nosso
município, as principais instituições de proteção e defesa dos Direitos da
Criança e do Adolescente – os Conselhos Municipal/COMUCAA e Tutelar/CONTUA, tem
se mantido em “obsequioso” silêncio, apesar das tentativas do Fórum DCA/dos
Direitos da Criança e do Adolescente e do CDVDH-CB/Centro de Defesa da Vida e
dos Direitos Humanos Carmen Bascaran de uma agenda para sensibilização e debate
com a sociedade açailandense.
O “Plano Municipal de
Atendimento Socio-Educativo”, o “SINASE municipal”, por lei deveria ser
aprovado e iniciado sua implementação, agora em dezembro de 2014, mas sequer se
iniciaram os estudos, pesquisas e discussões sobre o tema, e que deveriam ser “puxados”
justamente pelos dois órgãos públicos municipais, defensores dos DCA ( o
COMUCAA, órgão de caráter político, de atuação “no atacado”, e o CONTUA, órgão de atendimento
resolutivo mas situações de ameaças e violações dos DCA, órgão de atuação “no
varejo”).
Enquanto isso, o
noticiário local continua inflacionado com as “ocorrências envolvendo
adolescentes e jovens, em escala cada vez maior, assustadora mesmo”.
Como inexistem “programas,
serviços – políticas públicas competentes, eficazes – de prevenção”, dá no que
dá, como recente episódio divulgado pelo blog “rei dos bastidores” (“Policia
Militar revoga a Constituição e aplica pena de constrangimento em jovens”,
19/08/2014, e “OAB vai se posicionar, sobre o caso dos possíveis excessos da PM
em Açailândia contra jovens”, 22/08/2014).
Ou no desabafo do Major
PM Eurico Alves, em recente evento público, reclamando justamente desta
falta/ineficácia de políticas públicas (programas, serviços, projetos,
atividades, órgãos...), o que leva a sociedade a remeter para a PM a “solução
de todos os problemas sociais” (“rebeldia juvenil”, bullying escolar, carências-fragilidades-incompetências-
conflitos familiares, drogadição e
tráfico, “pequena criminalidade”, vandalismo...).
Mas enquanto a
sociedade açailandense, em sua, admitimos, esmagadora maioria, aliada a grande
parte do governo municipal (seus órgãos, serviços, programas...) “exige” a
redução da idade penal (... ideal se conjugada á pena de morte...), escamoteia,
varre para debaixo do tapete a verdade incontestável de que muito pouco, para
não dizer quase nada, tem feito e faz, para implementar o ECA/Estatutuo do
Criança e do Adolescente, Lei Federal
n.º 8.069/90, que tanto combatem mas de fato desconhecem e não respeitam...
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