Uma professora, ex-conselheira municipal dos direitos da criança e do
adolescente, me perguntou agora à tarde:
“Eduardo, que crise é essa nos Conselhos? Por que chegou a este ponto? Que coisa feia,
que vergonha! Quando isso vai resolver?”
Nas redes sociais, em e-mails, nas ruas e praças, me abordam,
questionam, até “cobram”...
Em verdade, a “área” dos Direitos da Criança e do Adolescente de
Açailândia, assim definida conforme as Leis Municipais n.º 132 e 136/97, e a
Lei n.º 387/2012, com seus principais órgãos, os Conselhos Municipal dos
Direitos da Criança e do Adolescente (COMUCAA) e Tutelar (CONTUA), vive sem dúvida,
a maior “crise” de sua história, de mais de vinte e dois anos.
São dias, aliás, praticamente três meses, de muita turbulência, com
prejuízo direto no atendimento dos Direitos de Crianças e Adolescentes, pois os
dois Conselhos deixam de cumprir com suas principais atribuições
(o COMUCAA, conforme o artigo 88, II e IV, do ECA; a Resolução CONANDA/Conselho
Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente n.º 105/2005- Parâmetros para
Criação e Funcionamento dos Conselhos
dos Direitos da Criança e do Adolescente, e a Lei Municipal n.º 132/97, artigos 6º a 10,
e o CONTUA, conforme o artigo 136 do ECA, a
Resolução CONANDA n.º 139/2010- Parâmetros para Criação e Funcionamento de
Conselhos Tutelares, e a Lei Municipal
n.º 132/97, artigo 17)
para
cuidarem de questões funcionais de conselheiro tutelar, de primeiro mandato,
denunciado duas vezes em menos de dois meses de mandato, iniciado no dia 06 de
junho passado...
De fato, o COMUCAA tem uma pauta atravancada, atrasada e pendente, de
muitas questões importantíssimas para a política municipal de atendimento dos
Direitos da Criança e do Adolescente de Açailândia:
formação continuada de atores da
rede de atendimento e SGD/Sistema de Garantia de Direitos, para assegurar
qualidade e eficiência dos programas e serviços; implantação das Práticas
Restaurativas e Justiça Juvenil Restaurativa; implementação do PCFC/Plano
Municipal de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes
à Convivência Familiar e Comunitária;
Enfrentamento da Violência Sexual
contra Crianças e Adolescentes; Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e
Proteção ao Trabalho Adolescente; monitoramento do atendimento às medidas
sócio-educativas; etc, etc.
Já o CONTUA, colegiado de cinco membros, que atende em tempo integral (“horário de expediente normal”, de
40-quarenta- horas semanais, mais plantões diários noturnos, de final de semana
e feriados)
nas situações de ameaças e
violações aos Direitos individuais de Crianças e Adolescentes e suas famílias,
adotando as medidas previstas nos artigos 98 a 102, e 129, do ECA.,
além da fiscalização de entidades de atendimento, juntamente com o
Ministério Público e Judiciário estaduais, de acordo com os artigos 95 a 97, do
mesmo ECA,
pública e notoriamente está dividido, entre acusações do conselheiro Glen Hilton a dois membros de persegui-lo por questão
política-partidária, chegando a dizer que ambos são do PT, conforme publicado
no blog do Gilberto Freire, em 02/08/2013;
e agora acusa a conselheira tutelar coordenadora de ter motivado a
denúncia do vazamento da denúncia do Disque 100, e causado toda essa crise
atual,
quando na verdade, no final de
julho, o colegiado foi unanime em denunciá-lo e afastá-lo).
Não bastasse este ambiente conflituoso,desidioso, interno no CONTUA, o “blog Rei dos Bastidores”, de 20/09, publica que a conselheira tutelar
Ivônia Sandra, também empossada em 06 de junho, renunciou ao cargo em meados de
agosto, por não aguentar as pressões...
Uma Comissão Especial do COMUCAA, constituída em 20/08, deveria concluir
seus trabalhos de apuração de vazamento da denúncia encaminhada pelo Disque ao
CONTUA, no dia de hoje.
Tal não aconteceu, e não há convocação breve prevista para o plenário do
COMUCAA apreciar e votar o Parecer dessa Comissão Especial, o que significa
dizer que a situação deve se arrastar, aprofundando “a crise”, pelas próximas
semanas.
Não se diga que nunca houve “crise” na história dos DCA/Direitos da
Criança e do Adolescente, de Açailândia,
pelo contrário, foram dezenas, envolvendo um ou outro, ou ambos os Conselhos,
mas como a atual, realmente, nenhuma...
Urge que se resolva essa situação, administrativa ou judicialmente,
a política de atendimento e as
atribuições dos Conselhos na promoção, proteção e defesa dos Direitos das
Crianças e dos Adolescentes, neste quadro de muita violência e desrespeito a esses
Direitos,
é que não continuar prejudicada,
por conta dos entreveros que hoje engalfinham os Conselhos COMUCAA e CONTUA.
Em tempo, a conselheira tutelar que renunciou, Ivônia Sandra, no primeiro
mandato e com dois meses de trabalho, e
o conselheiro tutelar Glen Hilton, pivô da atual crise, são neófitos na “área” dos Direitos da Criança
e do Adolescente, e Humanos.
E infeliz e lamentavelmente, profetizavam algumas vozes, devido a acontecimentos
discutíveis durante o processo de escolha do atual CONTUA, entre janeiro e
maio, que haveria problemas no horizonte, e logo, e é o que se constata hoje...
Para contribuir na reflexão deste triste momento, nada melhor que
rememorar o artigo de Antonio Carlos Gomes da Costa, pedagogo mineiro, que
formou na equipe criadora do ECA, nos idos finais dos anos oitenta, e falecido,
aos 61- sessenta e um- anos, no dia 04 de março de 2011, em Belo Horizonte.
Para Conselheiros(as) dos Direitos e Tutelares, ele é “O Mestre”:
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(do Portal Promenino)
Capacitação prévia dos conselheiros tutelares
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O Conselho Tutelar é
uma nova institucionalidade criada pela lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do
Adolescente).
Ele foi elaborado
para separar, nas atribuições dos juízes de menores, a função assistencial da
função judicante.
A função judicante, própria da justiça, é
resolver conflitos com base na lei.
Já a função
assistencial trata-se de receber, estudar e encaminhar casos de natureza
puramente assistencial.
O grupo de redação do
Estatuto da Criança e do Adolescente optou pela Doutrina da Proteção Integral
das Nações Unidas e, portanto, decidiu separar as funções judicante e tutelar
na justiça de menores, resgatando o verdadeiro papel da magistratura.
A decisão de que o Conselho Tutelar fosse
eleito pelos cidadãos partiu da vontade política de que ele não fosse um
Conselho Tutelado.
Sua função consiste em receber, estudar e
encaminhar casos, atuando com base no exercício de dois poderes: o poder de
requisitar serviços e o poder de peticionar ao Ministério Público, caso a
Requisição de Serviços não seja atendida, cabendo ao Ministério Público
ingressar na justiça da infância e da juventude com a Ação Civil Pública.
O Conselho Tutelar é
uma instituição típica da democracia brasileira, que resultou da Constituição
de 1988, segundo o Deputado Ulisses Guimarães, a Constituição Cidadã.
Naquele momento de
reconstrução democrática da vida nacional, nossa democracia deixou de ser
apenas representativa, para tornar-se, também, uma democracia participativa.
O artigo 1º da Constituição Federal determina
que “todo o poder emana do povo e será exercido por seus representantes
eleitos ou, diretamente, nos termos desta Constituição”.
O Conselho Tutelar
tornou-se, por esta via, uma das primeiras instituições da democracia
representativa, tornando-se o equivalente, no Direito da Criança e do
Adolescente, ao que representa o PROCON (Proteção e Defesa do Consumidor) no
Código do Consumidor, ou seja, um órgão garantista da exigibilidade dos
direitos assegurados nas normas internacionais, na Constituição e nas leis
voltados à população infanto-juvenil.
"Aqueles que verdadeiramente se
comprometeram com a causa dos direitos da criança e do adolescente devem
trabalhar e lutar para que essa capacitação prévia deixe de ser uma exceção e
passe a ser uma regra"
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O grande problema é
que, em muitas partes do Brasil, os conselheiros tutelares vêm sendo eleitos
pela força de interesses alheios aos direitos da criança e do adolescente.
Isso acarreta na eleição de pessoas
despreparadas para o exercício das funções acima descritas.
Muitos municípios decidiram pela realização de
uma seleção prévia para o credenciamento de pessoas aptas a se candidatarem ao
cargo de conselheiro tutelar.
Essa é uma providência de caráter saneador,
que resgata o verdadeiro sentido desse serviço público de tão grande
relevância.
Em tais municípios,
verificou-se uma considerável diminuição do uso instrumental do cargo de
conselheiro tutelar como trampolim para o tráfico de influências no nível da
política municipal.
Por outro lado,
verificamos que essa ainda não é uma prática generalizada e que,
freqüentemente, o poder local faz uso abusivo e irregular dessa
institucionalidade inovadora para fins clientelistas e fisiológicos,
desfigurando, assim, o caráter inovador desse colegiado de tipo novo.
A capacitação prévia
dos conselheiros tutelares e a fiscalização do processo de seleção democrática
pelo Ministério Público são as garantias com que hoje os cidadãos brasileiros
contam para assegurar o compromisso ético, a vontade política e a competência
técnica exigidos para uma verdadeira política de promoção e defesa dos direitos
da população infanto-juvenil em nosso país.
Com base nesse
raciocínio, podemos concluir que a capacitação prévia dos conselheiros
tutelares, mais do que um problema de natureza técnica, possui uma inarredável
dimensão ética e política.
Trata-se de evitar o desvirtuamento de uma
instituição que nasceu para ampliar o exercício da democracia participativa no
Brasil do pós-regime militar.
Portanto, todos
aqueles que verdadeiramente se comprometeram com a causa dos direitos da
criança e do adolescente devem trabalhar e lutar para que essa capacitação
prévia deixe de ser uma exceção e passe a ser uma regra em nosso país.
A democracia, podemos
concluir, é boa para a criança e para o adolescente, e estes – como diz Emílio
Garcia Mendez –, por sua vez, são bons para a democracia.
(Foto: Antonio Carlos Gomes da Costa, por Gastão Guedes)
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