O “fenômeno social”
da “Meninada do Trem” persiste, legado de praticamente duas décadas, afetando o
Maranhão e o Pará, principalmente os municípios ao longo do “Corredor Carajás”
cortado pela Estrada de Ferro Carajás, sem que o SGD/Sistema de Garantia de
Direitos de Crianças e Adolescentes, a rede de atendimento e as políticas
públicas, ofereçam respostas competentes e eficazes.
Em vários municípios,
e aqui no Maranhão sobretudo nós, Açailândia, como também Bom Jesus das Selvas
e Buriticupu, o tema é recorrente, e já foi objeto de audiência pública,
centenas e centenas de reuniões e eventos, protocolos e acordos, mas a
“Meninada...”, embora hoje com reconhecida menor incidência, ainda “perambula”
pelo Pará e nosso Estado timbira...
Não é, como já disse
e escrevi dezenas de vezes, “ocorrências” aventurescas, tipo “Tom Sawyer e
Huckleberry Finn”, mas evento muito mais profundo, demonstrativo da “questão
social brasileira”, nas ricas terras de Carajás.
Em razão do “fenômeno
Meninada do Trem” e dos “problemas” que causavam à mineradora Vale, dona da
Estrada de Ferro Carajás, bem como aos Conselhos Tutelares, às Promotorias de
Justiça e aos Judiciários, e às Assistência Social municipais, pelo menos aqui
em Açailândia chegou-se a alguns entendimentos; a Vale, em 2008, fez uma doação de praticamente trezentos mil
reais, via FIA/Fundo Municipal para a Infância e a Adolescência, e com ela a Prefeitura, construiu e equipou a
atual “Casa Abrigo”, extinguindo a “Casa de Passagem”.
Reuniões com Juiz de
Direito, Promotora de Justiça, Conselhos Municipal dos Direitos da Criança e do
Adolescente/COMUCAA e Tutelar/CONTUA, Secretarias Municipais de Assistência
Social e Administração, Fórum dos Direitos da Criança e do Adolescente/Fórum
DCA, acertou um “protocolo de atendimento”: * Meninos(as) apreendidos(as) pela
segurança da ferrovia, em seus trens (passageiro, cargas, minérios) seriam
encaminhados(as) de imediato ao Conselho Tutelar, que procederia sobre suas
origens e situações.
Enquanto isso, seriam
acolhidos(as) na “Casa Abrigo”, e depois a Vale se responsabilizaria pelas seus
retornos aos municípios de origem; * a Vale e o Conselho Tutelar veriam com a
Assistência Social do(s) município(s) de origem, medidas para
acompanhamento/atendimento ao(as) “Meninos(as) do Trem” e sua(a) família(a).
Esse “protocolo”, ao
que parece, já foi “detonado”...se é que algum dia foi respeitado...
Nesta sexta-feira
passada, 28/06, com desdobramento no sábado, 29/06, um dos “Meninos do Trem”,
de história bastante conhecida ao longo do “Corredor de Carajás”, mais uma vez
“aportou” em Açailândia (diz-se que a “Meninada do Trem” gostam de Açailândia,
pois aqui tem comida farta e descansam bem na “Casa Abrigo”, reenergizando-se
para suas perambulações...).
Foi “levado” por uma
siderúrgica ao CDVDH-CB/Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos Carmen
Bascarn, já no finzinho da tarde, que o “entregou” ao CONTUA, como tem de ser,
de acordo com o “protocolo”.
Para surpresa do
CDVDH-CB, já á noite, cerca de três horas depois de ter entregue formalmente o
“Menino do Trem” ao CONTUA, o conselheiro tutelar Glen Hilton o “devolve” ao
CDVDH-CB, que já encerrara seu expediente de trabalho (pois não trabalha em
regime de plantão, como o CONTUA...).
O incrível e
inacreditável é que o conselheiro tutelar ainda se atreveu a “condenar” o
CDVDH-CB, “justificando: o CONTUA só
atende Criança e Adolescente, até dezoito anos... se ele for drogadito, o
CDVDH-CB tem que apresentar laudo médico... o CONTUA não é obrigado e nem vai
atender...o Centro que se vire...”.
O CDVDH-CB, fazendo
sua parte, diante da recusa de atendimento do conselheiro tutelar, numa
situação que envolvia claramente um “Menino do Trem” ( ou ex-menino do trem, na concepção do conselheiro tutelar Glen
Hilton, alegando que já teria dezenove anos...), procurou o Ministério
Público, registrou ocorrência policial (por omissão de atendimento/socorro), e
“hospedou” o “Menino do Trem (ou ex- Menino do Trem...) em hotel no “setor
rodoviário”, de onde acabou ele “fugindo”...
O caso revela a pouca
atenção, revela o descaso do Poder Público, no caso representado pelo CONTUA,
com a realidade da “Meninada do Trem”.
O que tem sido feito nesta quase duas décadas,
é simplesmente “devolver e devolver”,
jamais se investindo seriamente nas condições pessoais, familiares e
comunitárias que levam os Meninos e as Meninas a perambularem pelo Corredor
Carajás, através dos “trens da Vale”, e possibilitem transformações sociais.
O triste é que o
CONTUA, no caso mencionado, tenha sido tão simplista, imediatista, não se
detendo em analisar e verificar melhor a situação do “Menino, ou ex- Menino do
Trem”, e tomar as providências e encaminhamentos necessários.
Com base neste
argumento furado que só pode atender Crianças e Adolescentes, até dezoito anos
incompletos, se esquecendo do atendimento focado nas famílias (com toda certeza, ex-Meninos e Meninas do
Trem ou tem irmãos que hoje “perambulam”, e talvez até filhos...), como
preconiza o ECA/Estatuto da Criança e do Adolescente, artigo 100, e as
Políticas Nacional de Direito Humanos de Crianças e Adolescentes, e de
Assistência Social, o CONTUA só consolida seu conceito em baixa junto à
sociedade ( o de que não resolve nada, e
atende mal a população que o procura, o que contraria também normas do
CONANDA/Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, sobretudo
em sua Resolução n.º 139/2010, que trata do funcionamento dos Conselhos
Tutelares).
O CDVDH-CB, através
de seu Secretário Executivo Antonio Filho, que ao longo da noite de
sexta-feira, pessoalmente se disponibilizou em buscar assegurar direitos do
“Menino, ou ex-Menino do Trem...), não vai deixar passar em branco, impune,
essa verdadeira “omissão de socorro”, esse descaso com a situação social
emergencial de um cidadão brasileiro,
cometida pelo conselheiro tutelar Glen Hilton.
(E cabe a indagação: e onde está o Menino, ou ex-Menino do Trem? Voltou
à ferrovia, perambular pelo Corredor Carajás, ou está nas ruas açailandenses?
Quem tem de responder?)
(Foto, da JnT/Justiça nos Trilhos, da mesa de autoridades em Audiência Pública na ALEMA/Assembléia Legislativa do Maranhão,em abril de 2012, para tratar do assunto "Meninada do Trem")