sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Um menino a passear!




Nos meus idos de criancice, lá em Curitibanos, Santa Catarina, Natal era muito mais Menino Jesus e Presépio, e muito pouquinho de papai noel...


Um Natal assim parecido como de Elaine Tavares...

(Eduardo Hirata)




Um menino a passear!




Eu acreditava piamente que havia um menino, bem sapeca, magrelinho e sem camisa, que saracoteava pelo mundo, montado numa grande estrela, levando presentes invisíveis aos olhos. E eu esperava o ano inteiro por esta noite de passeio divino


 (Elaine Tavares, jornalista, Brasil de Fato, 19/12/2013)


Sou filha do meu tempo e espaço. Nascida numa família cristã, desde pequenina o natal significou presépio, ou seja, a montagem da hora mágica na qual um menino veio ao mundo para anunciar uma boa nova.


 E, com ele, a promessa de que haveria outra aliança e que nossos pecados todos estariam perdoados. Lá em casa sempre demos prioridade a isso.


Nunca ao Papai Noel, brinquedos, compras, etc... A expectativa era a chegada do menino. Eu mesma sempre colocava o sapato na janela, mas a mãe explicava: “os presentes não são coisas, são sentimentos e desejos”.


Então, quando o dia amanhecia eu entendia que um gurizinho tinha nascido e, por força da mágica da religião, também havia passado pela janela deixando amor, saúde, alegria e todas essas coisas boas. E recolhia aquele sapato como se fora a coisa mais preciosa do mundo.


Na minha mente de criança eu imaginava não um velhinho montado no trenó, com renas e todas estas coisas da celebração européia.


 Eu acreditava piamente que havia um menino, bem sapeca, magrelinho e sem camisa, que saracoteava pelo mundo, montado numa grande estrela, levando presentes invisíveis aos olhos.


 E eu esperava o ano inteiro por esta noite de passeio divino. E o legal era que o fato dele ser um guri tirava toda a pomposidade do sagrado filho. Era como esperar um amigo, coisa íntima.


Depois eu cresci e fui conhecendo outros mitos, outras religiões. Aprendi a dar pago à terra (Pachamama) em agosto, a respeitar o trovão, a folha de coca, as plantas, os animais.


Aprendi a honrar Kuaray, jacy, Ñanderu. Aprendi a reverenciar outras manifestações criadas pelo humano para sustentar suas dores e medos. Porque é disso que se trata quando se fala de deuses. Eles são redes nas quais descansamos de nossos terrores.


 E, esta construção humana me enche de ternura, porque reconheço aí a fragilidade da nossa raça. Isso me emociona.


Mas, apesar de tudo o que aprendi sobre os outros deuses, o natal ainda me encanta de um jeito muito especial, talvez porque esteja colado na minha mãe, que já encantou.


 Então, a despeito de todas as impossibilidades, eu espero o menino. Às vezes, nos tumultos familiares ou no barulho da festa, pode parecer que eu o esqueci, mas não. Lá no fundo do meu coração, eu o espero.


 E o vejo chegar, montado na estrela, rindo seu riso de cristal. Também a despeito de tudo, ainda deixo meu sapato na janela e o recolho de manhã com a absoluta certeza de que ali dentro estarão os presentes. Os que verdadeiramente importam.


E, assim, neste natal, como em todos os outros já vividos, meu jesuzinho haverá de vir passear. E eu estarei esperando...


Que ele passe por aí também!...



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