segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

UMA JUSTIÇA INJUSTA






Caramba, que justiça (com j minúsculo mesmo...) é essa, narrada pelo Frade Marcos Sassatelli, no artigo  que, concordando  com ele em gênero, número e grau, transcrevo a seguir?


E no nosso querido Maranhão, como será que andam as coisas, o judiciário criou juízo e começa a dar (bom) exemplo?


Aqui em Açailândia, já teve (será que não foi revogada ainda?) uma lei municipal, do início dos anos noventa, governo Leonardo Lourenço de Queirós, concede(u) “auxílio moradia a juízes(as), naturalmente com o rico dinheirinho público da terrinha...


O que acontece em Goiás, e certamente acontece também em outros Estados, e também na esfera federal, deve ser bem refletido pela gente ingênua que acredita que com  o desenrolar da AP 470 (me recuso a usar a palavra sacada pela grande imprensa, Veja à frente...), a corrupção e as maracutaias já eram...


2013 terminando ótimo, no campo judicial...


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Uma Justiça “injusta”


Concordo plenamente, em gênero, número e grau, com Humberto Milhomem, quando afirma: “mais uma vez percebe-se que o Brasil é o país dos oportunistas, dos aproveitadores, das castas privilegiadas, dos marajás...”

(Por Fr. Marcos Sassatelli, no jornal “Brasil de Fato”, 30®/12/2013)


Lendo a manchete “TJ aprova vale-alimentação para juiz e desembargador” (O Popular, 17/12/13, 1ª página), fiquei profundamente estarrecido e indignado.


Lembro que - além do auxílio-alimentação (R$ 418 mensais) - os magistrados recebem também o auxílio-moradia (10%  do salário, mensalmente) e o auxílio-livro (12%  do salário, uma vez ao ano). O salário de juiz em início de carreira é cerca de R$ 22 mil e o salário do presidente do TJ-GO é cerca de R$ 30 mil. Coitados, os nossos juízes e desembargadores, estão passando necessidade! Poderiam ser inscritos no programa “Bolsa-Família”! Ironias a parte, é realmente um descaramento total.


Concordo plenamente, em gênero, número e grau, com Humberto Milhomem, quando afirma: “mais uma vez percebe-se que o Brasil é o país dos oportunistas, dos aproveitadores, das castas privilegiadas, dos marajás...”. E ainda: “a extensão do vale-refeição aos juízes e desembargadores - privilégio que outras categorias do Judiciário já possuem - é, antes de tudo, uma acinte à população”.


Para mostrar o absurdo e a imoralidade do benefício, ele lembra, como exemplo, “que os professores dos Estados e dos Municípios de todo o Brasil não têm direito sequer ao lanche servido aos alunos, muito menos ao vale-refeição. E por que essa categoria não é merecedora deste direito?”.


Humberto continua dizendo: “muitos professores, para dar conta das contas em casa, trabalham em dois turnos, tendo menos de uma hora para almoçar, uma vez que as aulas terminam às 12:15 e começam às 13 horas. Vão, então, para o segundo turno com fome, sem se alimentar. E quanto ganham os professores? O salário é de R$ 1.567,00. Isto mesmo! Com este mísero salário não têm direito ao vale-refeição”.


A partir dessa realidade de gritante desigualdade, ele pergunta: “quanto ganha um desembargador?”. Responde: “mais de R$ 20 mil. Estes absurdos - afirma Humberto - nos fazem entender por que o Brasil é um dos países mais injustos do mundo, um país de contrastes que só crescem”


Termina, pois, o seu desabafo, dizendo: “agora, com todos esses privilégios, por que nossa Justiça é a pior do mundo, ninguém consegue entender. Talvez esteja na hora do Governo Federal, a exemplo dos médicos, importar juristas cubanos mais eficientes e menos caninos na hora de atacar o erário” (Humberto Milhomem. Ib, 18/12/13. Carta dos leitores, p. 6).


Humberto, todos e todas, que temos um mínimo de sensibilidade humana e de senso ético, somos solidários e solidárias com a sua justa indignação.


Em contraste com a denúncia de Humberto, vejam agora o despudor do juiz de direito e presidente da Associação dos Magistrados do Estado de Goiás (ASMEGO), Gilmar Luiz Coelho. Para justificar o injustificável, a ASMEGO - através de seu presidente - “reitera que não defende nenhum tipo de privilégio para qualquer categoria. Defende, ao contrário, respeito, dignidade e igualdade no tratamento de qualquer trabalhador. Ao requerer o pagamento do direito, o fez fundamentada na Constituição Federal (artigo 129, parágrafo 4º) e na Resolução 133 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que prevê equiparação entre as carreiras da Magistratura e do Ministério Público”.


A ASMEGO ressalta “que o direito não é vedado pelo CNJ, sendo pago nos Tribunais Superiores e na imensa maioria dos Tribunais de Justiça brasileiros. Destaca que o valor aprovado pela Corte Especial do TJ-GO é bem inferior ao que é pago, por exemplo, ao MP: R$ 418,00 para magistrados, enquanto o MP paga a promotores e procuradores R$ 710,00. E também que não haverá pagamento retroativo a cinco anos, como no caso do Ministério Público” (Ib.).


Vejam, também, o despudor do promotor Alencar José Vital, presidente da Associação Goiana do Ministério Público (AGMP). Ele afirma, com todas as letras, que “não vê imoralidade no pagamento do auxílio-alimentação”. Para o promotor, “a concessão é legal e há outros benefícios que o MP-GO ainda não recebe”. E adianta: “vou atrás para recebermos”


Apresentando as razões, Alencar José diz: “o pedido do pagamento do auxílio-alimentação retroativo a 2008 e do reajuste do valor partiu da AGMP. Qual a justificativa para esse pedido? Esse benefício está previsto para o Ministério Público Federal (MPF) desde 1993. Com a criação do CNJ, passou-se a dar um caráter de similaridade nacional para os magistrados e membros do MPF. Com isso, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) reconheceu a simetria entre MPF e MPs estaduais. E é importante ressaltar que isso já vale para outros órgãos da Justiça, como STF, STJ, que já recebiam o auxílio. Nós fomos um dos últimos Estados a pagar esse benefício”.


Sobre o assunto em questão, o promotor demonstra ter uma visão meramente legalista, corporativista e egocêntrica. Nas suas palavras não transparece a mínima preocupação com a sociedade, que é estrutural e legalmente injusta, que exclui e descarta as pessoas com a maior frieza e crueldade, e que é baseada na lei do mais forte, que é a lei da barbárie.


A respeito da conquista do benefício (que, diante de Deus - tenho certeza - é um malefício), Alencar José declara: “comemoramos entre nós. A nossa obrigação, da Associação, é lutar pelos nossos direitos. Na medida em que a PGJ aquieceu a um pedido nosso, que foi feito dentro da lei, da fundamentação que se aplica a todo território nacional, não vejo problemas”.


Perguntado se, na concessão do benefício do auxílio-moradia, não há imoralidade, o promotor diz: “o norte da sociedade moral é a lei. Porque o julgamento moral dessa ou aquela ação é subjetivo. Agimos em cima da legalidade”.


Não dá para acreditar que um promotor possa, honestamente, fazer uma afirmação como essa. Até uma criança do Ensino Fundamental sabe que nem tudo o que é legal, é ético. Na sociedade, a imoralidade é, na maioria das vezes, legalizada e institucionalizada. Ora, quando a lei é injusta, toda pessoa ética tem a obrigação de não aceitar os benefícios concedidos por ela e, se for necessário - em nome do direito à “objeção de consciència” - tem também a obrigação (mesmo com risco de vida) de praticar a “desobediência civil” e de lutar para que a lei seja mudada. O comportamento ético é o comportamento mais humano possível numa determinada situação concreta.


Defender o “auxílio-alimentação e outros auxílios em causa própria, é muita cara-de-pau dos magistrados. Esses juízes e desembargadores não têm moral e, portanto, não têm condição de fazer justiça. Como podemos confiar numa Justiça “injusta”, que é um verdadeiro assalto aos cofres públicos? É lamentável que, em pleno século XXI, exista ainda tanto atraso cultural e ético.


Que - depois de recebermos, com alegria e esperança, a Boa Notícia do Natal de Jesus - 2014 seja, para todos e todas nós, um ano de muito compromisso com a construção de uma nova sociedade, justa, igualitária, de verdadeiros irmãos e irmãs. Feliz Ano Novo!


Em tempo: voltarei a escrever no início do mês de fevereiro/14.


(Fr. Marcos Sassatelli, Frade dominicano é doutor em Filosofia (USP) )


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