DIA NACIONAL DE COMBATE AO TRABALHO:
CENTRO DE DEFESA DA VIDA E DOS DIREITOS HUMANOS CARMEN BASCARAN APRESENTA O PROJETO RAICE/REDE DE AÇÃO INTEGRADA DE
COMBATE AO TRABALHO ESCRAVO
DIA NACIONAL DE COMBATE AO TRABALHO ESCRAVO
No dia 29 de janeiro de 2018, às 9h
da manhã o Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos Carmen Bascarán -
CDVDH/CB, na sua sede, comemorou, o DIA NACIONAL DE COMBATE AO TRABALHO
ESCRAVO, data que lembra a todas as vítimas do Trabalho Escravo e, especialmente,
a Chacina de Unaí, onde três auditores fiscais e um motorista foram
assassinados durante uma operação de fiscalização na área rural do Estado de
Minas Gerais, no ano 2004.
Numa roda de conversa com poder
público, onde estiveram apenas presentes representantes da Secretaria Municipal
de Educação - SEMED, o Conselho Municipal dos Direitos das Crianças e
Adolescentes – COMUCAA e o Conselho Tutelar - CONTUA, sociedade civil organizada,
com a presença de entidades como Associação Comunitária dos/as Moradores/as do
Piquiá -ACMP, Justiça nos Trilhos – JNT, Associação Comunitária Juscelino
Kubitcheck de Oliveira – ACJKO, Bom de Bola Bom de Escola, Pastoral da Criança,
Agentes de Saúde e a comunidade em geral, o CDVDH/CB apresentou a situação do
Trabalho Escravo no Maranhão e concretamente no município de Açailândia,
evidenciando o alto índice deste crime contra a humanidade nas fazendas,
carvoarias e construtoras locais.
Segundo o Ministério Público do
Trabalho - MPT, o Maranhão se encontra como o primeiro[1] Estado
que é local de origem de trabalhadores/as que são escravizados/as no próprio
Estado e Estados vizinhos e, dentre seus municípios, Açailândia, junto com
Santa Luzia e o Codó, destacam por ser os principais locais de origem e
incidência de casos de Trabalho Escravo.
Desde sua fundação, o CDVDH/CB
assumiu a bandeira do combate ao Trabalho Escravo como foco principal no seu
objetivo na Defesa dos Direitos Humanos, dado o alto número de casos
encontrados em Açailândia e região, com características de total desumanidade
onde têm trabalhadores/as que foram assassinados/as, outros morreram em
acidentes ou doentes, numas condições de trabalho análogas à escravidão. A
maior parte destes/as trabalhadores/as são aliciados/as pelos
"Gatos", normalmente também gerentes das fazendas e as carvoarias
onde ocorre a escravidão. Os gatos oferecerem grandes oportunidades de emprego,
com carteira, salário justo, alimentação, hospedagem, passagem até o local de
trabalho, deslocamento, mas isso não falam que será tudo descontado do/a
trabalhador.
As fazendas e carvoarias, normalmente
distantes e isoladas em áreas de difícil acesso, os/as trabalhadores/as são
obrigados/as a beber água dos brejos onde o gado banha e bebe, dormem apenas
protegidos/as por um barracão de madeira e lona plástica, onde a chuva, as
muriçocas, ratos e baratas estão presentes cada noite; não tem banheiros, a
alimentação é só café puro, arroz e feijão, e é pouco e de má qualidade, se têm
um acidente ou ficam doentes não têm assistência médica, tem que comprar tudo
com o “gato”, desde o sabonete até as ferramentas de trabalho. Trabalham sem
horários, o dia todo, roçando a juquira, construindo cercas, derrubando
árvores, enchendo e esvaziando os fornos do carvão. São ameaçados/as,
insultados/as, alguns/mas agredidos/as fisicamente, sexualmente e, ao final do
mês, do semestre, dos anos, só têm dívidas com o patrão.
Esta é
nossa realidade do Trabalho Escravo, esse é o crime que o CDVDH/CB, enfrenta há
mais de 20 anos, junto com muitos/as outros/as parceiros/as.
Desde julho do ano passado, com o
apoio da ONG espanhola Manos Unidas, o CDVDH/CB está implementando o projeto RAICE - Rede de Ação Integrada para Combater
a Escravidão - projeto piloto que pretende a articulação
inter-setorial para efetivar ações de prevenção e inserção social de famílias
sobreviventes do Trabalho Escravo ou vulnerável a ele, através de atividades
socioculturais para crianças e adolescentes, formação cidadã, capacitação profissional,
organização comunitária para a geração de emprego e renda, a conquista de
direitos e, articulando-se com outras organizações e as políticas públicas,
esta responsabilidade do poder público municipal e estadual, garantir que essas
famílias acessem à educação, à saúde, aos serviços sociais e, em conjunto,
quebrar os fatores chave de vulnerabilidade dessas famílias e comunidades
diante à escravidão.
Tudo isso, pretendendo também
identificar modelos válidos e efetivos de enfrentamento à escravização que
possam ser replicados em outros municípios do Estado.
O Trabalho Escravo é conseqüência
direta de uma discriminação estrutural histórica, econômica, política e
cultural, associada a uma violação sistemática dos direitos fundamentais, que
se sustenta no Brasil de geração em geração. Por isso, o ciclo da escravidão passa
necessariamente pela prevenção e a repressão deste crime, bem como pelo
estímulo de alternativas que levem à inserção social das vítimas, efetivando o
direito de seu desenvolvimento pleno, adquirindo uma visão crítica e
construtiva que lhes permita assumir seu protagonismo e um papel ativo como
transformadores/as de sua realidade local, atendendo os níveis pessoal,
familiar, comunitário, profissional, econômico e cultural.
Por isso, para o êxito da proposta,
sem dúvida, é necessário a articulação e compromisso por parte do poder
público. A SEDIHPOP - Secretaria de Estado dos Direitos Humanos e Participação
Popular, a COETRAE/MA - Comissão para a Erradicação do Trabalho Escravo no
Maranhão, o MPT - Ministério Público do Trabalho, a SETRES - Secretaria de
Estado de Trabalho e da Economia Solidária a Organização Internacional do
Trabalho - OIT, já são alguns/mas dos/as parceiros/as comprometidos/as em
apoiar a iniciativa do CDVDH/CB que pretende implementar, além de em
Açailândia, em Santa Luzia, Pindaré Mirim e Monção.
No dia 29, foi o momento de
sensibilizar e articular os organismos e organizações de Açailândia, onde,
depois de apresentar e discutir várias alternativas de parceria e envolvimento
com o projeto, que em concreto pretende o atendimento de 24 famílias resgatadas
do Trabalho Escravo e 50 famílias em situação de vulnerabilidade, todas elas da
Vila Ildemar, foi encaminhado que: representantes
de organismos locais começarão a participar dos eventos de formação cidadã
comunitária que o CDVDH/CB organiza periodicamente nos bairros da Vila Bom
Jardim e Vila Ildemar para a formação de novas lideranças na área da prevenção
e denúncia do Trabalho Escravo; Agentes de Saúde, Professores/as, Agentes dos
Sistema de Garantia de Direitos das Crianças e Adolescentes e Agentes da
Assistência Social começarão a ter um olhar diferenciado em relação a possíveis
situações de Trabalho Escravo e se articularão com o CDVDH/CB para a
verificação e atendimento desses casos; potencializaremos a articulação e
mobilização cidadã para a pressão social não apenas para enfrentar o Trabalho
Escravo, mas as inúmeras violações de Direitos Humanos que acontecem no nosso município.
Além disso, o CDVDH/CB pretendia
apresentar às Secretarias Municipais todas as demandas detalhadas dessas
famílias, mas, infelizmente, apenas participou a SEMED que se dispôs a ajudar
no que for possível, sobre tudo no incentivo ao retorno à escola e pensar
alternativas mais eficientes para a alfabetização de pessoas adultas.
Para a realização do evento, o
CDVDH/CB contou com o apoio fundamental de voluntários/as, especialmente de
Jessé Rosa que percorreu todas as ruas de Açailândia distribuindo convites e
sensibilizando aos organismos públicos para participar do evento, e Almudena
Sánchez Malmierca, (Instagram de Almudena: almudena_almodicreativa), ilustradora
espanhola que, ao conhecer a causa do CDVDH/CB, decidiu contribuir através da
sua arte nos ajudando com o cartaz para a divulgação.
Muito obrigado/a a todos/as os/as que
nos ajudaram e participara deste momento de articulação local que representa um
grande passo para avançar no combate ao Trabalho Escravo em Açailândia.
·
Do site do CDVDH-CB:
[1] http://www.ma10.com.br/2017/09/30/maranhao-e-o-primeiro-em-ranking-de-trabalho-escravo-no-brasil-segundo-mpt/
*** Um
dos ‘temas’ mais em voga em Açailândia do Maranhão nos últimos anos tem sido “rede,
atendimento em rede, atuação em rede, mobilização em rede, rede, rede, rede...”.
Chegamos a constituir várias, mas a exemplo da “rede de enfrentamento à
violência sexual contra Crianças e Adolescentes”, através do Grupo de Monitoramento,
competência do COMUCAA/Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do
Adolescente, ou da “rede de enfrentamento ao trabalho infantil”, “redes” só
mesmo no papel, como foi levantado e criticado na plenária aberta.
Os
objetivos e metas do projeto RAICE são simples, claros e diretos, mas a
atenção, a execução, não podem ficar só nas costas do CDVDH-CB, mas dependem
fundamental da “rede”, e de cada instituição/programa/atividade, seja
pública-governamental ou civil/comunitária, com sua ação específica, de
assistência e previdência social, saúde, educação, profissionalização-geração
de emprego e renda.
Tomara que
a RAICE constitua-se em fator animador e rejuvenescedor das outras “redes
socioassistencias e de promoção, proteção e defesa de Direitos Humanos” aqui em
Açailândia do Maranhão, hoje esfaceladas quando não francamente ‘desativadas,
inoperantes’...
(Eduardo Hirata)
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