07 de
março de 2018, no “ Viomundo”
O ministro
Osmar Terra, presidente do Conad, recusou o pedido de vistas
do Conselho Federal de Psicologia; o cerceamento fere o próprio
regimento do Conselho.
(Fotos de Osmar Terra e do CONAD: Marcelo
Camargo/Agência Brasil, via Fotos Públicas.)
Nota Técnica sobre a Resolução 01/2018 do Conselho Nacional de
Políticas sobre Drogas (CONAD), de 01/03/2018, sobre a política sobre drogas no
Brasil
As
entidades, grupos de pesquisa e coletivos abaixo assinados, Associação
Brasileira de Saúde Mental (ABRASME), o Laboratório de Estudos e Pesquisas em
Saúde Mental e Atenção Psicossocial – FIOCRUZ, o Projeto Transversões
(ESS-UFRJ), o Coletivo Pró-Frente em Defesa do SUS e da Reforma Psiquiátrica –
RJ e o Grupo de Pesquisa em Políticas de Saúde e Saúde Mental (GPPS-UFSC)
cumprindo seus objetivos de monitorar, investigar e analisar a política
brasileira no campo da saúde mental e drogas, vêm a público expressar sua
avaliação acerca da resolução 01/2018, aprovada no Conselho Nacional de
Políticas sobre Drogas (CONAD) no dia 01/03/2018, que visa reorientar esta
política no país a partir de agora.
A
proposta de mudança foi apresentada no em 01 de dezembro de 2017, sem abertura
de debate.
Na
reunião de 01/03, o Conselho Federal de Psicologia (CFP), como membro titular
do CONAD, pediu vistas no processo com o objetivo de estudar novos
posicionamentos, o que foi recusado pela presidência do conselho.
Esta
decisão é arbitrária e fere claramente o Regimento Interno do CONAD.
Em seu
artigo Art. 13 (“sobre as incumbências de seus conselheiros”), particularmente
em seu inciso IX, faculta o direito destes a “solicitar o adiamento, por uma
sessão, da votação de assuntos incluídos na pauta ou submetidos extrapauta,
quando solicitar vistas à matéria”.
O Art.
23, reza:
“Qualquer membro do CONAD, que não se julgar suficientemente
esclarecido em matéria constante da pauta, poderá apresentar pedido de vista,
por uma sessão”, direito detalhado em seus parágrafos 1º (“O pedido de vista
individual somente poderá ser aceito uma vez”) e 2º (“ Se houver mais de um
pedido de vista, o Presidente poderá conceder vista coletiva da matéria”).
A
resolução CONAD 01/2018 na verdade implica em uma mudança significativa da
política de drogas no país.
De uma
abordagem diversificada de atenção psicossocial para diferentes públicos e
necessidades, norteada pela estratégia de redução de danos, para uma ênfase
única e exclusiva na abstinência cujo principal instrumento é a internação de
usuários de drogas.
Encerra
o processo de debate que de forma intensa é travado mundialmente, e no Brasil
vinha ganhando grande destaque, sobre as variadas experiências internacionais
de legalização e/ou descriminalização do uso pessoal de drogas hoje ilícitas.
Subliminarmente
aponta para a ênfase na terceirização de serviços providos por
entidades da sociedade civil, privilegiando o investimento estatal nas chamadas
“comunidades terapêuticas”.
Estas
majoritariamente mantidas tanto por empresas privadas lucrativas como por
entidades filantrópicas/religiosas.
Tais
instituições são objeto de sindicâncias nos últimos anos por parte de entidades
de direitos humanos e de conselhos profissionais, que constataram inúmeras e
frequentes violações de direitos humanos básicos de seus internados.
Esta resolução desfaz uma política de Estado
sem um debate com a sociedade — especialistas, profissionais, pesquisadores,
entidades entre outros- – em um campo complexo, polêmico, com variadas
experiências internacionais e amplo escopo de pesquisas retratando os
resultados da política vigente no Brasil.
No
mínimo, em um processo democrático, tal proposta exigiria a abertura de um
amplo debate nacional mobilizando pesquisadores, profissionais, entidades
e trabalhadores do campo, e os próprios usuários e seus familiares.
Existem
diversas recomendações neste sentido. Merece destaque a do Conselho Nacional de
Direitos Humanos que exalou a Recomendação n.o 02/2018, de 31/01/2108, ao
CONAD, para que, “antes da aprovação de qualquer iniciativa tendente a alterar
as diretrizes da atual Política de Álcool e outras Drogas:
a)
Promova audiências públicas, com ampla divulgação;
b)
Encaminhe e realize debates junto à Comissão Interinstitucional de Saúde Mental
(CISM) do Conselho Nacional de Saúde (CNS) e à Subcomissão de Drogas deste
Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH);
c)
Promova debate públicos entre especialistas e organizações da sociedade civil
que trabalham com a temática em diferentes campos e posições.”
A
Resolução 01/2018 do CONAD legisla não apenas sobre uma política simples de um
governo específico, mas sobre uma Política de Estado de saúde mental e drogas
consolidada e constituída por meio de quatro conferências nacionais nas últimas
três décadas.
As
conferências nacionais, de acordo com Lei 8.080 de 19/09/1990, constituem a
instância máxima de definição das diretrizes da política de saúde do país. São
organizadas a partir de um processo de decisão que se inicia em conferências
realizadas nos mais diversos municípios do país, depois em cada um dos estados,
que depois convergem em uma etapa nacional.
Assim,
o Relatório da III Conferência Nacional de Saúde Mental, realizada em 2001,
enfatiza em diversos pontos a prioridade da política de redução de danos. Como
exemplo a proposta aprovada de nº 190 postula:
190: Garantir que a atenção aos usuários de álcool e outras
drogas adote estratégias de redução de danos. E, também, implantar o Programa
de Redução de Danos – PRD – em todos os municípios, promovendo o envolvimento
da comunidade, visando prevenir e reduzir a transmissão de DST/AIDS.
No
Relatório da IV Conferência Nacional de Saúde Mental – Intersetorial, realizada
em 2010, as resoluções são claras na mesma direção, como observa-se nas
propostas aprovadas abaixo:
N.º 486: De modo
especial, implica também a estratégia de redução de danos como política pública
de saúde; e expandir, em todo o território nacional, a rede de cuidados em
saúde mental para os usuários de álcool e outras drogas, garantindo de forma
irrestrita o direito à saúde e a uma melhor qualidade de vida.
Nº487:Dessaforma , assume particular relevância efetivar a política de redução de danos doSUS na rede de atenção psicossocial, nos
diferentes níveis de atenção,
fortalecendo aspráticas territoriais e a construção de redes sociais de redução de danos, em contraponto ao
modelo predominante focado na abstinência, moralização, penalização e criminalização do
usuário de álcool e outras drogas.
Assim,
a atual resolução 01/2018 do CONAD desrespeita as diretrizes maiores da
política de saúde mental e drogas como política de Estado, e uma eventual
mudança tão radical de orientação, de acordo com a Lei 8.080 do SUS, deveria
requerer a realização de nova conferência nacional.
E isso
não é tudo.
A
resolução 01/2018 do CONAD vai exatamente na contramão das diretrizes da
Organização Mundial de Saúde.
Em seu
relatório de julho de 2014, a organização faz uma clara recomendação para uma
política de drogas baseada na “descriminalização do uso de drogas, de práticas
de redução de danos, tais como a troca de seringas e terapias de substituição
de opióides, e de banimento do tratamento compulsório para pessoas que usam
drogas.”
O
cerceamento do direito de vistas ao CFP na reunião do CONAD de 01/03/2018
constitui contravenção regimental no próprio Conselho.
A
motivação de tal postura por parte da presidência do Conselho, como exposto
acima, nos parece muito mais a de impedir um debate público mais aprofundado
que deixaria claro as fragilidades normativas da nova portaria, e sua
contraposição à Política de Estado sobre drogas e saúde mental já consolidada
no país desde 2001 e às diretrizes da Organização Mundial de Saúde, a partir
das experiências internacionais mais balizadas e reconhecidas.
Do
exposto, as entidades abaixo assinadas conclamam as entidades e conselhos
profissionais e de pesquisa, as entidades de direitos humanos, os diversos
coletivos e movimentos sociais de defesa da reforma psiquiátrica e da política
de drogas, a também se aprofundarem suas avaliações sobre a Resolução 01/2018, e
a buscar as alternativas para provocar sua rediscussão e procurar reverter seus
efeitos.
Além
disto, apresentam às várias instâncias das Defensorias Públicas e do Ministério
Público a demanda de analisar cuidadosamente as possíveis iniciativas legais
cabíveis, diante das questões levantadas nesta nota técnica, e particularmente
tendo em vista que a aprovação desta resolução se sustentou no não cumprimento
do regimento do próprio CONAD.
·
Rio de
Janeiro e Florianópolis, 07 de março de 2018
Associação
Brasileira de Saúde Mental (ABRASME)
Laboratório
de Estudos e Pesquisas em Saúde Mental e Atenção Psicossocial – FIOCRUZ
Projeto
Transversões (Projeto Integrado de Pesquisa Desinstitucionalização, Saúde
Mental e Abordagens Psicossociais – ESS-UFRJ)
Coletivo
Pró-Frente em Defesa do SUS e da Reforma Psiquiátrica – RJ
Grupo
de Pesquisa em Políticas de Saúde e Saúde Mental (GPPS-UFSC)
*** Pior
ainda então aqui em Açailândia do Maranhão. Já se transformou em rotina a triste
condição de dezenas de usuári@s pelas ruas, calçadas, terminal rodoviário, praças da cidade, e no
histórico e emblemático “casqueiro”...
·
Não se tem notícia de alguma “política pública municipal anti-drogas
e álcool”, apesar da existência do
conselho/COMAD.
·
O que se constata, além da realidade de dezenas de usuári@s
nas ruas, é a ineficência e insuficiência do CAPS, ou algo parecido na saúde
pública, e da falta quase absoluta de assistência social. O município tem investido
mais em comunidade terapêutica, ou ‘mandando pra fora”, isso quando faz alguma
coisa, mas com “retorno’ mínimo, pífio...
·
Não temos uma “pesquisa ou estudo oficial”, mas pragmaticamente
pode-se afirmar que “a droga ( e aqui droga é maconha, crack, cocaína; álcool, não, é bem social...) é a maior das ‘questões
sociais’, que afetam nossas famílias e sociedade.
(Eduardo Hirata)
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