segunda-feira, 1 de julho de 2013

CONSELHO TUTELAR DE AÇAILÂNDIA NEGA ATENDIMENTO A “MENINO DO TREM”


O “fenômeno social” da “Meninada do Trem” persiste, legado de praticamente duas décadas, afetando o Maranhão e o Pará, principalmente os municípios ao longo do “Corredor Carajás” cortado pela Estrada de Ferro Carajás, sem que o SGD/Sistema de Garantia de Direitos de Crianças e Adolescentes, a rede de atendimento e as políticas públicas, ofereçam respostas competentes e eficazes.

Em vários municípios, e aqui no Maranhão sobretudo nós, Açailândia, como também Bom Jesus das Selvas e Buriticupu, o tema é recorrente, e já foi objeto de audiência pública, centenas e centenas de reuniões e eventos, protocolos e acordos, mas a “Meninada...”, embora hoje com reconhecida menor incidência, ainda “perambula” pelo Pará e nosso Estado timbira...

Não é, como já disse e escrevi dezenas de vezes, “ocorrências” aventurescas, tipo “Tom Sawyer e Huckleberry Finn”, mas evento muito mais profundo, demonstrativo da “questão social brasileira”, nas ricas terras de Carajás.

Em razão do “fenômeno Meninada do Trem” e dos “problemas” que causavam à mineradora Vale, dona da Estrada de Ferro Carajás, bem como aos Conselhos Tutelares, às Promotorias de Justiça e aos Judiciários, e às Assistência Social municipais, pelo menos aqui em Açailândia chegou-se a alguns entendimentos; a Vale, em 2008,  fez uma doação de praticamente trezentos mil reais, via FIA/Fundo Municipal para a Infância e a Adolescência,  e com ela a Prefeitura, construiu e equipou a atual “Casa Abrigo”, extinguindo a “Casa de Passagem”.

Reuniões com Juiz de Direito, Promotora de Justiça, Conselhos Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente/COMUCAA e Tutelar/CONTUA, Secretarias Municipais de Assistência Social e Administração, Fórum dos Direitos da Criança e do Adolescente/Fórum DCA, acertou um “protocolo de atendimento”: * Meninos(as) apreendidos(as) pela segurança da ferrovia, em seus trens (passageiro, cargas, minérios) seriam encaminhados(as) de imediato ao Conselho Tutelar, que procederia sobre suas origens e situações.

Enquanto isso, seriam acolhidos(as) na “Casa Abrigo”, e depois a Vale se responsabilizaria pelas seus retornos aos municípios de origem; * a Vale e o Conselho Tutelar veriam com a Assistência Social do(s) município(s) de origem, medidas para acompanhamento/atendimento ao(as) “Meninos(as) do Trem” e sua(a) família(a).

Esse “protocolo”, ao que parece, já foi “detonado”...se é que algum dia foi respeitado...

Nesta sexta-feira passada, 28/06, com desdobramento no sábado, 29/06, um dos “Meninos do Trem”, de história bastante conhecida ao longo do “Corredor de Carajás”, mais uma vez “aportou” em Açailândia (diz-se que a “Meninada do Trem” gostam de Açailândia, pois aqui tem comida farta e descansam bem na “Casa Abrigo”, reenergizando-se para suas perambulações...).

Foi “levado” por uma siderúrgica ao CDVDH-CB/Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos Carmen Bascarn, já no finzinho da tarde, que o “entregou” ao CONTUA, como tem de ser, de acordo com o “protocolo”.

Para surpresa do CDVDH-CB, já á noite, cerca de três horas depois de ter entregue formalmente o “Menino do Trem” ao CONTUA, o conselheiro tutelar Glen Hilton o “devolve” ao CDVDH-CB, que já encerrara seu expediente de trabalho (pois não trabalha em regime de plantão, como o CONTUA...).

O incrível e inacreditável é que o conselheiro tutelar ainda se atreveu a “condenar” o CDVDH-CB, “justificando: o CONTUA só atende Criança e Adolescente, até dezoito anos... se ele for drogadito, o CDVDH-CB tem que apresentar laudo médico... o CONTUA não é obrigado e nem vai atender...o Centro que se vire...”.

O CDVDH-CB, fazendo sua parte, diante da recusa de atendimento do conselheiro tutelar, numa situação que envolvia claramente um “Menino do Trem” ( ou ex-menino do trem, na concepção do conselheiro tutelar Glen Hilton, alegando que já teria dezenove anos...), procurou o Ministério Público, registrou ocorrência policial (por omissão de atendimento/socorro), e “hospedou” o “Menino do Trem (ou ex- Menino do Trem...) em hotel no “setor rodoviário”, de onde acabou ele “fugindo”...

O caso revela a pouca atenção, revela o descaso do Poder Público, no caso representado pelo CONTUA, com a realidade da “Meninada do Trem”.

 O que tem sido feito nesta quase duas décadas, é simplesmente “devolver e devolver”, jamais se investindo seriamente nas condições pessoais, familiares e comunitárias que levam os Meninos e as Meninas a perambularem pelo Corredor Carajás, através dos “trens da Vale”, e possibilitem transformações sociais.

O triste é que o CONTUA, no caso mencionado, tenha sido tão simplista, imediatista, não se detendo em analisar e verificar melhor a situação do “Menino, ou ex- Menino do Trem”, e tomar as providências e encaminhamentos necessários.

Com base neste argumento furado que só pode atender Crianças e Adolescentes, até dezoito anos incompletos, se esquecendo do atendimento focado nas famílias (com toda certeza, ex-Meninos e Meninas do Trem ou tem irmãos que hoje “perambulam”, e talvez até filhos...), como preconiza o ECA/Estatuto da Criança e do Adolescente, artigo 100, e as Políticas Nacional de Direito Humanos de Crianças e Adolescentes, e de Assistência Social, o CONTUA só consolida seu conceito em baixa junto à sociedade ( o de que não resolve nada, e atende mal a população que o procura, o que contraria também normas do CONANDA/Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, sobretudo em sua Resolução n.º 139/2010, que trata do funcionamento dos Conselhos Tutelares).

O CDVDH-CB, através de seu Secretário Executivo Antonio Filho, que ao longo da noite de sexta-feira, pessoalmente se disponibilizou em buscar assegurar direitos do “Menino, ou ex-Menino do Trem...), não vai deixar passar em branco, impune, essa verdadeira “omissão de socorro”, esse descaso com a situação social emergencial de um cidadão brasileiro,  cometida pelo conselheiro tutelar Glen Hilton.

(E cabe a indagação: e onde está o Menino, ou ex-Menino do Trem? Voltou à ferrovia, perambular pelo Corredor Carajás, ou está nas ruas açailandenses? Quem tem de responder?)


(Foto, da JnT/Justiça nos Trilhos, da mesa de autoridades em Audiência Pública na ALEMA/Assembléia Legislativa do Maranhão,em abril de 2012, para tratar do assunto "Meninada do Trem")

(Eduardo Hirata)